MOTELx 2013 - Entrevista a Rui Pilão, Realizador Em Competição Com a Curta Desespero

 
O Portal Cinema vai acompanhar de perto o MOTELx 2013, mas enquanto o festival não começa decidimos conhecer um pouco melhor os nove realizadores que este ano vão participar na Competição Oficial do MOTELx - Prémio Yorn MOTELx que, tal como tem vindo a acontecer, apenas é aberta à participação de realizadores portugueses. A vitória nesta competição vale ao realizador vencedor e ao seu trabalho o título de Melhor Curta do MOTELx, mas também um prémio monetário de 3000 euros, a que acrescem 2500 euros em serviços de pós-produção vídeo na Pixel Bunker e ainda um fim-de-semana de inspiração num dos Hotéis Belver, um dos patrocinadores do festival. Esta competição é portanto muito importante para os nove realizadores em competição, que aproveito desde já para congratular pelo trabalho realizado, e agradecer o tempo disponibilizado para participarem nesta pequena iniciativa do Portal Cinema, que tem como principal objetivo dar a conhecer ao público estes jovens realizadores e os seus respetivos trabalhos e, quem sabe, aguçar o apetite para o que o público poderá ver na Competição de 2013 do MOTELx. As nove entrevistas que foram feitas aos nove participantes – Nuno Sá Pessoa (Bílis Negra); André Gil Mata (O Coveiro); Carlos Amaral (Longe de Éden); Alex Barone (Monstro); Rui Pilão (Desespero); Paulo Araújo (Nico - A Revolta); João Seiça (Hair); Miguel Ângelo (Sara); Patrick Mendes (A Herdade dos Defuntos) – pretendem portanto dar a conhecer as suas respetivas curtas que estão a concurso, mas também o seu percurso profissional, os seus objetivos e gostos pessoais, os seus planos para o futuro e as suas expetativas para o MOTELx 2013.

O quarto entrevistado desta pequena iniciativa é o realizador Rui Pilão, que apresentará no MOTELx 2013 a curta “Desespero” (Escrita por Rui Pilão/ Com Miguel Rubim, Vanessa Ribeiro Rodrigues, Avelina Silva, Sofia Trocado/ Duração - 13 Min.), que tem a seguinte sinopse oficial: A crise e as medidas de austeridade empurram um homem para actos desesperados que colocam a existência da sua família em risco.

Portal Cinema (PC) - O que o levou a enveredar pelo mundo do cinema? O que o seduz nesta indústria? Que projetos é que se destacam na sua filmografia?
Rui Pilão (RP) - A primeira profissão que desejei ter quando era criança, era ser inventor. Recordo-me de fazer desenhos e de construir “máquinas”. Logo depois passei por uma fase quase de militar em que planeava estratégias de guerra e construía bombas. Não explodiam realmente, só mesmo no meu imaginário, não era um miúdo agressivo. Ao longo dessa minha infância e vida até hoje, sempre fui um sonhador, independentemente daquilo que num determinado momento desejava ser. Ao longo deste caminho que todos fazemos por vezes perdemos algumas coisas. Nunca me senti bem no sistema de ensino, da forma como era idealizado e posto em prática e acabei por me perder um pouco. Vivi 4 anos no País de Gales, onde me licenciei em som, porque na altura estava a passar pela fase do vocalista de banda Metal! Embora eu sempre tivesse sido um apaixonado por cinema, penso que qualquer sonhador o seja, foi devido a um problema de saúde que tudo mudou. Coincidiu no momento em que conclui a licenciatura, voltei para Portugal e após andar um pouco desmotivado durante algum tempo, finalmente descobri o queria ser, realizador. Transmitir a minha visão, aquilo que eu sinto e criar algo com a ajuda de pessoas tão apaixonadas quanto eu. Mas eu não tinha formação nessa área, nem conhecia ninguém que trabalhasse no ramo, muito menos se possa dizer que haja tradição de cinema em Bragança, que é de onde eu sou e onde naquela altura vivia. Todas essas dificuldades e obstáculos que enfrentei para realizar a minha primeira curta-metragem “Aqui jaz a minha casa”, foram a minha escola de cinema. Eu não tenho vergonha nenhuma de admitir que houve momentos em que já me desmotivei, e que pensei em desistir, mas mudou quando vi essa minha primeira curta a ser exibida, numa sala praticamente vazia é verdade, mas eu não me importei porque foi um momento muito especial para mim. São momentos como esse que me levam a lutar, e o de um dia conseguir conquistar a confiança e carinho do público. Que confiem tanto na qualidade do meu trabalho que basta o meu nome estar associado a um filme e nem precisem de ver o trailer para comprar um bilhete. Ou daquela pessoa que após um dia árduo de trabalho, chega a casa, cansada, toma um banho e senta-se no sofá a ver um filme que eu realizei, e durante aquele momento os seus problemas desaparecem. São coisas que eu idealizo, e me dão força para continuar

PC - A participação de “Desespero” na competição oficial do MOTELx é uma grande oportunidade para a sua carreira. O que sentiu quando descobriu que a sua curta foi selecionada para competir pelo Prémio Yorn MOTELx deste ano? Já tem algum plano para o prémio monetário, caso vença a competição?
RP - Sinceramente senti-me como se tivesse realizado um sonho porque enquanto escrevia o argumento para esta curta o meu objetivo era já de participar no Motelx. Tanto que filmamos em Julho de 2012 mas como tinha passado da data de inscrição nesse ano, esperei e felizmente foi selecionada nesta edição, é no Motelx que vai estrear. Portanto para mim foi uma vitória. Ter a oportunidade de dar uma entrevista como esta, de poder exibir a curta numa sala do prestigiado Cinema São Jorge, de conhecer pessoas do meio e de começar a ser reconhecido, isso para mim é muito importante. Se tiver a honra de vencer o prémio o que posso garantir é que vou dar-lhe o valor que merece. Isso seria algo que me ajudaria a abrir portas e conseguir criar projetos mais ambiciosos. Quanto ao prémio monetário creio ser importante retribuir repartindo-o com toda a equipa que trabalhou e acreditou no projeto. Quem sabe se não poderia ser uma oportunidade de reunir todas essas pessoas num novo projeto, desta vez financiado, e de novo a estrear no Motelx.

PC - A história de “Desespero” é muito atual e até muito realista. Que tipo de ideias é que quis passar e explorar com este projeto? O filme representa a concretização total da sua visão inicial? 
RP - Fico contente por ter achado isso. Realmente o objetivo era idealizar uma história o mais realista possível e sobre um tema atual. Procurei fazer algo português, sem negar as minhas origens, mas fundi-lo com um género que é o terror. Acredito que a história é o mais importante num filme, tudo o resto deve existir unicamente para a servir. Depois claro que é importante conseguir conta-la de uma forma cativante tendo em conta todas as limitações de tempo e orçamento. Eu adoro cinema de terror e como tal quando comecei a realizar sempre tive vontade de experimentar esse género. Sendo esta a minha primeira vez, pensei em seguir uma abordagem mais realista porque considero que seja esse o terror mais assustador. Consegue tocar o público e sensibiliza-lo. Se pensarmos que esta curta tem uma duração de 13 minutos incluindo os créditos, torna-se complicado criar algo cativante e muito importante também, criar empatia pelos personagens. Esse foi provavelmente o meu maior desafio em termos narrativos. Tentei explorar uma componente muito psicológica e criar a ideia do anti-herói. Como eu encaro as minhas curtas como uma escola de cinema, procuro desafiar-me, e todo este projeto foi pensado de forma a expor-me a desafios e dificuldades, para me testar e ver como conseguiria solucionar os problemas no momento. O ser filmado num só local, tempo limitado, orçamento que basicamente foi só para cobrir alimentação e maquilhagem, tudo contribuiu para me por à prova. Da mesma forma que os próprios personagens na história também eles foram postos à prova devido à questão financeira, entre outras. Mas como eu idealizei o projeto com as limitações em mente, consegui concretizar a minha visão. Provavelmente não pude filmar ou correram mal dois ou três planos devido a falta de tempo ou até de espaço por ser um apartamento e por não ter feito testes ou ensaios (outro desafio que me coloquei!), mas não afetou a história, se fossem cruciais teria arranjado forma de os fazer. Sinto que dei o meu melhor e estou orgulhoso do trabalho da minha equipa.

PC - O seu projeto destaca-se dos restantes filmes em competição porque tem uma história mais próxima à nossa realidade. O que o levou a tomar esta opção? Teme que o público não perceba a sua ideia e reaja mal a esta opção narrativa?
RP - Esse sempre foi o meu principal objetivo, destacar-me dos outros, fazer algo não só pela diferença mas ter objetivos bem definidos. Fazer um filme exige muito das pessoas envolvidas, por isso quando se decide avançar para qualquer projeto deve-se ter em mente que o resultado deve ter um propósito e deve provocar reações no público. O filme é para eles e não para mim. Se os conseguir cativar, se os conseguir fazer acreditar na história de tal forma que no final fiquem a pensar e cheguem a recear que lhes aconteça algo assim, cumpri a minha missão. Quando escrevi o argumento pensei no impacto que a crise iria causar a médio ou longo prazo nas famílias Portuguesas. Para muitas foi um choque tremendo, um dia tinham um estilo de vida e no seguinte deixaram de o ter. Creio que essa perspetiva altera o estado mental de qualquer pessoa, podendo leva-los ao tal desespero que procurei personificar nesta curta-metragem. Infelizmente logo após eu ter escrito começou a surgir nos meios de comunicação social, notícias sobre o mesmo tema. Passei de uma mera curta ficcional para algo com outra seriedade. Adoro e respeito muito o género de terror, mesmo que na maioria das vezes este envolva o sobrenatural e isso realmente é assustador. Mas um terror que pode realmente acontecer, que as pessoas se deitam e acordam a pensar. O contar dos dias até receber o ordenado sabendo que mesmo assim de nada serve porque não chega para pagar as contas. O drama do desemprego. Isso é verdadeiramente assustador. Pela primeira vez o público vai ter a oportunidade de entrar na casa de uma família e ver todo o drama vivido. Algo que até agora só poderíamos imaginar ao ler o jornal ou ver o noticiário.

PC -  Como é que escolheu os atores que participam em “Desespero”? Estiveram à altura do desafio?
RP - O ator Miguel Rubim conheci-o num casting que fiz para outro projeto que ainda está pendente. Gostei tanto da imagem dele que quando escrevi o argumento do “Desespero” pensei logo nele para desempenhar esse papel. A atriz Vanessa Rodrigues foi-me recomendada pelo Diretor de Fotografia António Morais. Fiz-lhe um casting e fiquei muito surpreendido pelo talento e entrega que deu, visto ser a sua primeira participação numa curta-metragem. Essa entrega e dedicação acabou por se revelar essencial na rodagem. A atriz Avelina Silva foi-me recomendada pelo Miguel depois de eu lhe ter descrito a personagem, e quando a conheci percebi que realmente encaixava perfeitamente naquilo que pretendia transmitir. A atriz Sofia Trocado foi uma escolha especial por várias razões, eu estava a procura de alguém muito específico e felizmente consegui. Esteve muito bem e o resultado está à vista. Aliás, todos fizeram um excelente trabalho e não me canso de o dizer. Devo-lhes muito.

PC - Tem algum realizador que o inspire e cuja carreira admire? Qual é o seu filme favorito?
RP - Complicado escolher só um. Foi dependendo da idade e fase da vida, mas alguns marcaram-me mais e ainda hoje admiro. É o caso do Sergio Leone e o seu incontornável “Once upon a time in America”. Vi-o com o meu pai, foi um momento que me marcou, apaixonou-me por várias razões e tanto o filme como a banda sonora fazem-me reviver aquele momento sempre que revejo. Atualmente admiro muito o Christopher Nolan, adorava poder trabalhar com ele. Mas foram muitos os realizadores que a dada altura me fizeram e fazem sonhar, James Cameron, Ridley Scott, Steven Spielberg, John Carpenter, Quentin Tarantino...a lista contínua. Penso ter influências de todos eles a nível subconsciente e provavelmente isso vai-se refletir no meu trabalho ao longo do tempo.

PC - O que espera da edição deste ano do MOTELx? O que é que lhe chama mais a atenção na programação deste ano?
RP  Estou com grande expectativa, já reservei os dias 11 a 15 para fazer uma maratona de terror, vou a tudo o que for possível. Quero absorver toda a experiência e perceber como funciona um dos mais bem-sucedidos festivais nacionais. É importante perceber também o que o público procura e está à espera de obter dessa experiência que é o Motelx. Uma coisa é certa, arriscando a ser um chato vou tentar conhecer o maior número de pessoas da área e criar contactos, na minha opinião isso sim é o mais importante de participar num festival. Na programação, para já, existem pelo menos dois filmes que não posso perder, The Conjuring de James Wan (era brutal se ele viesse também!) e Byzantium de Neil Jordan. Sem esquecer a grande oportunidade de poder conhecer o Tobe Hooper e o Hideo Nakata. Tenho a certeza que vão ser uns dias interessantes e quem sabe o que poderá surgir daí.

PC - O que podemos esperar do Rui Pilão no futuro? Já tem algum novo projeto em mente?
RP - Podem esperar mais e melhor. O meu objetivo é aprender sempre com os erros e nunca ter vergonha de assumi-los. Estou constantemente em aprendizagem, e vou tentando atingir resultados cada vez mais ambiciosos. Parar não é uma opção para mim e não tenho medo de arriscar, ajo quase como se não tivesse nada a perder, porque penso que é pior o arrependimento por não ter feito do que por ter feito mal. Acredito que se for trabalhador e estiver nesta área pelas razões certas um dia alguém vai apostar em mim e valorizar-me, as portas foram feitas para se abrirem. Neste momento tenho duas curtas-metragens em pré-produção, uma dentro do género fantástico e outra dramática. Em breve vou concluir a escrita de mais dois argumentos que vão avançar também durante o próximo ano. Vontade e ideias não me faltam, umas precisam de financiamento e estou a tentar, infelizmente tem sido difícil para alguém que está a começar. Mas para não ficar parado vou idealizando outros projetos que consigo fazer quase sem dinheiro tal como o “Desespero”. Sim eu disse quase, porque eu não posso deixar que uma equipa que me esta a ajudar, sem ser remunerada, passe a rodagem a comer bolachas de água e sal. Faço curtas baratas é verdade, mas não exageremos.

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