E Agora Para Algo Completamente Diferente: Análise Crítica/Turística a Marselha (França)




Marselha é a capital da região francesa de Provence-Alpes-Côte d'Azur e é considerada a segunda cidade mais importante de França, sendo apenas superada em população e importância comercial e cultural por Paris, a capital do país. Os seus galardões históricos são de conhecimento público, afinal de contas estamos a falar de uma das cidades mais conhecidas e visitadas de França e da Europa que conta com raízes culturais e sociais que remontam à pré-história. Embora a história de Marselha seja rica em importância estratégica, histórica e política, como ponto turístico não é de todo um paraíso, pelo menos em comparação com outras cidades francesas.

OS LOCAIS DE INTERESSE

Ao contrário de Paris, Marselha pode ser facilmente visitada de uma forma prática no espaço de dois dias. Não é por isso o local ideal para uma visita de longa duração, já que o interesse turístico e cultural da cidade esgota-se num curto espaço de tempo. Posto isto, Marselha tem os seus pontos históricos que devem ser vistos pelo menos uma vez na vida. O principal é, na minha opinião, o Porto Velho/ Vieux Port. 
Para quem não sabe, Marselha é desde a antiguidade uma cidade portuária que deve muito da sua economia às industrias do mar. Nos dias que correm o Porto Velho já não é tanto um porto marítimo, mas sim uma grande marina que acolhe embarcações de pequeno porte, algumas delas luxuosas, mas outras bastante humildes. A sua importância reduz-se portanto ao seu apelo turístico, já que a rota comercial e industrial de Marselha passa, por estes dias, pelo vizinho Grande Porto de Marselha, esse sim o local onde os cruzeiros de luxo e os maiores navios de mercadoria atracam. Em termos comparativos, o Porto Velho equivale à Marina de Albufeira de Portugal, tendo claro está um tamanho e uma relevância turística muito maior.
As margens do Porto Velho são adornadas pelas ruas mais movimentadas da cidade, sendo também nestas zonas que encontramos o maior número de restaurantes e bares por metro quadrado. Um passeio vespertino e relaxante pelas margens do Porto Velho é, portanto, essencial para absorver a dinâmica turística da cidade e confesso que vale a pena passear pelas margens desta atração turística na companhia de um par romântico. Não é que o passeio em si seja romântico, mas revela-se uma experiência muito agradável se o tempo ajudar. E claro está, tal passeio pode e deve ser intercalado por uma ou mais refeições num dos muitos restaurantes que estão localizados nesta zona. A maior parte deles aproveita-se da localização privilegiada para cobrar preços exorbitantes, mas devido à forte competição entre estabelecimentos encontram-se facilmente opções que oferecem preços mais competitivos e com uma ementa para todos os gostos gastronómicos.

Entre o Porto Velho e o Grande Porto de Marselha encontram-se outras importantes atrações turísticas. Entre eles está a Cathedrale de la Major, a segunda catedral mais importante e imponente da cidade, sendo apenas superada pela Basilique Notre Dame de la Garde. Por estes dias, a Cathedrale de la Major está a ser renovada, mas a sua fachada continua imponente e merece ser devidamente contemplada. A entrada no local é gratuita, pelo que se encoraja a todos que entrem e admirem o seu interior igualmente imponente. O pátio da catedral oferece também uma vista muito agradável sobre a zona costeira de Marselha que, num dia de sol, conquista uma beleza superior. A caminho da Cathedrale de la Major recomenda-se uma expedição à parte velha da cidade, onde se pode apreciar a arquitetura mais clássica e onde, pelo meio, encontramos perdido no meio dos prédios rústicos, o La Vieille Charité (Também Museu). A nível estrutural não é imponente, até porque as suas origens são as mais humildes possíveis, mas torna-se interessante descobrir e observar este pequeno edifício que em tempos albergou os mais carenciados de Marselha.
É claro que ao longo desta expedição pela parte velha da cidade qualquer turista dá de caras com outros edifícios que são donos de uma bela arquitetura clássica, entre os quais várias pequenas igrejas e edifícios que atualmente têm um cariz governamental ou privado. Pelo meio existem várias pequenas praças que apelam a um merecido descanso. Na margem do Porto Velho contrária à Cathedrale de la Major está localizada, também na parte velha dessa margem, a Ópera de Marselha e o Palais du Pharo, dois locais significativos mas que não compensam um maior aprofundamento.
Nesta margem está também localizada uma das grandes atrações de Marselha, a Basilique Notre Dame de la Garde. Mal se chega à cidade é logo das primeiras coisas que se vê ao longe, já que está localizada no topo de uma colina, mantendo assim toda a localidade sobre a sua sombra. O caminho até ao local é árduo e, por isso, se está apenas de passagem por Marselha talvez não seja o local mais prático para ser visitado, mas a vista que oferece sobre a cidade deve ser tida em conta num possivél planeamento turístico. Já que se fala em edifícios eclesiásticos icónicos da cidade, a Église Saint-Vincent de Paul é também um ponto de referência arquitétonico de Marselha, mas a sua localização reclusa aliada à sua fraca relevância turística tornam-na num ponto dispensável que, por isso mesmo, não cheguei a visitar.
Entre pontos históricos também não se pode visitar Marselha sem passar no Porte D'aix, o equivalente ao Arco do Triunfo de Marselha. À semelhança da Cathedrale de la Major, também o Porte D'Aix se encontra em obras, mas é possivél ainda assim admirar a sua estrutura. E quando digo que não se pode visitar Marselha sem passar por aqui digo-o literalmente, já que este monumento fica situado numa das artérias da cidade por onde se passa, por exemplo, para ir para a zona do Porto Velho ou da Ópera. O mesmo se pode dizer da bela estação ferroviária da cidade, a Gare de Marseille-Saint-Charles. O edifício é muito bonito e é logo a primeira coisa que se visita, caso se chegue de autocarro ou comboio. Um dos pontos fulcrais deste edifício é a sua imponente escadaria que é adornada por uma belíssima paisagem arquitétonica. Terá também que passar por aqui se quiser apanhar um metro para visitar os jardins do Palais Longchamp, a maior zona verde da cidade. 
São estes os principais pontos turísticos do centro da cidade, sendo que Marselha é também rica em museus de vários tipos. Nenhum destes estabelecimentos tem, no entanto, a relevância social e cultural de outros museus europeus. É por isso que não são um must see numa viagem prática da cidade. É claro que se tiver que escolher um museu para visitar, o imponente Mucem - Museum of European and Mediterranean Civilisations deve ser a sua escolha. Se por outro lado o orçamento não é muito e o interesse particular não passa por passar uma tarde dentro de um museu, então aproveite para conhecer outros locais.


Nas redondezas do centro de Marselha estão localizados outros pontos emblemáticos da região que são proibitivos para uma visita curta, mas que podem ser admirados numa visita mais longa da cidade. O principal destaque é, claro está, o emblemático Château d'If, a mais icónica ex-prisão de Marselha que serve como cenário para o famoso livro "The Count of Monte Cristo", de Alexander Dumas. Um pouco mais longe fica o Parc National des Calanques, que deve ser encarado como o principal ponto de passagem para os amantes da natureza, assim como as praias da região, que ficam demasiado longe da cidade para serem devidamente apreciadas. 
Estes são os pontos turísticos que qualquer guia turístico recomenda, sendo que acrescentei à sua descrição um pequeno toque da minha experiência particular. Esta minha experiência pessoal em Marselha não incluiu visitas a museus ou às zonas mais distantes da cidade. Foi uma visita breve mais mais do que suficiente para conhecer, compreender e absorver o espírito do local. É claro que, como apreciador de cinema, fiquei com pena de não ver de perto o Château d'If, mas não considero a visita a este local uma parte essencial da experiência social de Marselha.

A CIDADE

É através do passeio pelas muitas ruas da cidade que se conhece a mesma e que se forma uma opinião do seu ambiente. Não tenho por isso nada de negativo a apontar à beleza dos principais monumentos turísticos que visitei, nomeadamente o Porto Velho que me conquistou pela sua vivacidade. O que há apontar de negativo não reside nos seus locais turísticos, que são por definição merentórios de uma visita, mas sim ao ambiente da própria cidade em si.
Em dois dias trilhei de alto a baixo as ruas do centro da cidade e os caminhos da sua zona velha. Entre as visitas à maior parte dos monumentos já referidos deu para observar a fraca qualidade económica da cidade. À semelhança de Paris, Marselha é rica em bairros sociais muito problemáticos com uma vasta diversidade étnica, onde claro está existem pessoas de bem e de mal. O problema é que não é só na periferia da cidade que estão as suas zonas mais complicadas. A cidade em si está bem tratada nos pontos que interessam, mas muito mal aproveitada nos pontos mais escondidos que são, precisamente, essas zonas problemáticas. Estas existem devido à precariedade económica da região, aliás esta é mesmo uma das mais pobres de França. Um forte indicador disto mesmo é que pelas ruas de Marselha não andam, por exemplo, grandes carros de luxo, mas sim veículos bem mais económicos e modestos.


Não é só o pulso económico da cidade que se consegue medir por intermédio de um passeio abrangente pelas suas ruas, já que também se consegue perceber que Marselha é uma localização privilegiada do fluxo migratório, posição essa que traz consigo muitas pessoas de bom tom, mas também algumas de mau tom que recorrem ao crime para sobreviver.  Não é de estranhar por isso o forte aparato policial que se observa nas ruas. Tal não se deve apenas à insegurança terrorista, mas também à própria taxa de criminalidade da cidade que está bem acima da média francesa. Tal aparato só é visível de dia, já que de noite, excluindo a zona do Porto Velho, Marselha torna-se numa cidade deserta e bastante morta que dá azo, como é óbvio, a assaltos e outros crimes. É por isso uma cidade a evitar explorar de noite, até porque não é propriamente uma metrópole rica em vida e estabelecimentos noturnos.
Há também partes da cidade que são muito sujas e que não se evidenciam como pontos de passagem. Neste ponto particular reforça-se que na periferia de qualquer uma das grandes avenidas de Marselha existem múltiplos becos, onde a própria polícia local desaconselha a passagem de turistas devido à insegurança que se verifica. É claro que passei por mais que um desses becos sem problemas durante o dia, mas compreendi facilmente os avisos da polícia local devido ao que observei nas mesmas, entre as quais, perseguições policiais e jovens a serem revistados pelas autoridades ou, claro está, várias pessoas embriagadas à porta das tascas locais.  E isto leva-me a outra parte importante da visita a Marselha, os carteiristas.
Todas as grandes cidades europeias são afetadas pelo problema dos carteiristas, mas o caso de Marselha é bem mais grave do que observei em outras metrópoles. A média deste tipo de crimes é assustadora e nota-se que os turistas estão informados disto mesmo, já que é raro ver um turista ou um habitante local que exiba riqueza. Até às máquinas fotográficas são cuidadosamente escondidas pelos transeuntes estrangeiros que vemos passar na rua. 


A POPULAÇÃO

Por muito politicamente incorreto que seja, não se pode ignorar que Marselha não é uma cidade pacifica devido à sua população. Esta representa um vasto leque de multiculturalismo que na teoria se revela socialmente curioso, mas que na prática traduz-se num ambiente socioeconómico bastante propício a visíveis situações de carência e instabilidade social.
Também se reforça que a população de Marselha não é muito acolhedora. Na minha viagem encontrei pessoas simpáticas, mas a maior parte dos habitantes locais primam pela antipatia e pela pouca vontade em ajudar turistas perdidos, algo que para uma cidade turística que depende muito deste sector de atividade revela-se surpreendente.


Se não souber falar francês ou árabe torna-se também difícil explorar a cidade. É claro que nos principais estabelecimentos comerciais há, pelo menos, uma pessoa que arranha o inglês, mas no comércio local não conte muito com este apoio, aliás neste tipo de espaços o árabe chega mesmo a ser tão predominante como o francês. Aliás em Marselha o árabe é quase tão falado como o próprio francês, sendo portanto um fenómeno multicultural curioso de observar, já que nem em Paris se observa esta dinâmica que demonstra, como já se disse, que Marselha está no epicentro de uma vasta rota de migração.


A CONCLUSÃO

Por força das suas caracteristiticas particulares e da limitação de pontos turísticos de relevo, Marselha torna-se portanto numa cidade onde dificilmente alguém quer perder mais do que um fim de semana prolongado. Como destino de praia, Marselha é uma nulidade apesar do seu clima temperado, isto devido acima de tudo à distância exagerada das suas praias. Como destino cultural já é mais interessante, mas é mesmo uma daquelas cidades para só visitar uma vez na vida, já que uma segunda visita torna-se profudamente redundante quando já se viu tudo o que há para ver.
Se quer visitar Marselha não terá que despender muito dinheiro. Na época baixa com um orçamento de 150 Euros por pessoa consegue facilmente viajar até à cidade e passar lá um fim de semana completo, onde pode aproveitar os seus escassos encantos que se resumem, como já referi, às visitas aos seus principais pontos turísticos. 
Pela companhia pessoal e pelo roteiro que fiz acabei por trazer boas recordações de Marselha. Fiquei bem hospedado e tive boas experiências gastronómicas, não tendo no entanto experimentado a Bouillabaisse, o prato típico da região, devido ao seu preço. Isto porque uma verdadeira Bouillabaisse não fica por menos de 80 Euros. Não sou fã de marisco ou caldeiradas por isso sinto que não perdi grande coisa, mas se tiver oportunidade experimente esta caldeirada de peixe bem típica.
Nos dois dias que passei em Marselha senti que fiquei a conhecer-lhe o espírito e que aproveitei tudo aquilo de positivo que esta tinha para oferecer e até algumas coisas de negativo, como os transportes públicos. Não se pode dizer que tenha ficado com uma ótima impressão da cidade em si, mas ainda assim apreciei a minha estadia precisamente por ter sido tão curta e focada no que importa. 

O Melhor - Vieux Port. A zona do Porto Velho é emblemática, lindíssima e vivaz a toda a hora. Se viajar acompanhado tem que passar por este local e jantar num dos seus muitos restaurantes. Será a experiência mais marcante que trará da cidade e poderá também aproveitar para comprar numa das suas muitas lojas um dos sabões artesanais da cidade.

O Pior - O Ambiente de Marselha. Não é uma cidade segura ou simpática. Embora seja a segunda cidade de França e os seus pontos de interesse esgotam-se rapidamente. Tem que se ter um cuidado redobrado durante os passeios pelas suas ruas e caso vire no sítio errado poderá meter-se facilmente em problemas....

Recomendações: 1- Não se aventure em visitas sem apoio pelas zonas periféricas de Marselha, nomeadamente pelas zonas mais a Norte que são consideradas as menos seguras da cidade; 2 - Os transportes públicos têm um alcance limitado, mas são ainda assim a melhor maneira para se descolar de forma célere no centro da cidade; 3 - No centro de Marselha evite ao máximo por questões de segurança as zonas mais recatadas e menos movimentadas da cidade; 4 - Não é uma cidade deslumbrante, mas Marselha tem os seus encantos e as suas delícias características, por isso aconselha-se aqui mais que em qualquer outra cidade francesa um estudo antecipado da mesma e um planeamento cuidado da visita a esta localidade.

Enviar um comentário

0 Comentários

//]]>