Realizado por Ming-liang Tsai (Tsai Ming Liang)
Com Kang-sheng Lee,
Kuei-Mei Yang, Yi-Ching Lu
Como encontrar um sentido para a vida, dentro de uma
sociedade profundamente consumista, quando nada se possui ? É esta a questão que
se coloca ao protagonista de Cães Errantes, um alcoólico, com dois filhos e abandonado pela
mulher. Fora o lugar-comum de esse sentido vir a ser descoberto através dos
afectos, a obra do internacionalmente galardoado Ming-liang Tsai explora,
através de uma fotografia lindíssima e da quase ausência de diálogos, a
vulnerabilidade do ser individual perante uma cultura de felicidade forçada que,
quer queiramos quer não, o capitalismo, sobretudo através da publicidade mas
não só, tenta tornar hegemónica.
Transformado em outdoor humano, ou seja, convertido em objecto de um
sistema que o abandonou, o pai tenta conduzir o dia-a-dia dos seus filhos com
uma normalidade absurda. Vivendo de amostras grátis de comida oferecidas em
supermercados e fazendo a higiene pessoal e casas de banho públicas, estas
personagens tocam no fundo da alienação pessoal que em determinado momento das
nossas vidas todos vimos a sentir. A dignidade da sua luta pela sobrevivência
longe de a diminuir, torna, em última análise, esta família profundamente
humana, pois, desprovidos de todos os bens materiais, eles são o homem nu
colocado perante si mesmo.
Se o ritmo arrastado do filme contrasta vivamente
com a aceleração da sociedade que retrata a um ponto quase incómodo para o
espectador, ele funciona também como o momento de pausa em que a lente é
colocada sobre elementos quase invisíveis da sociedade consumista, seja em
Taipei , Nova Iorque, Rio de Janeiro ou Lisboa.
Sensível a esta tão acutilante quanto poética
análise da tragédia individual, o Júri do Festival de Veneza atribuiu a Cães Errantes o seu Prémio Especial em 2013. Para além desta
galardão, o mérito da obra foi reconhecido em inúmeros outros festivais
internacionais.
Classificação - 4 Estrelas em 5
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