Com Ana Moreira, Ricardo Aibéo, Rogério Samora, Margarida Vila-Nova
O último grande projecto cinematográfico de João Botelho foi o vergonhoso “Corrupção”, um filme de fraca qualidade que levou os portugueses às salas de cinema pelas piores razões. Dois anos depois da estreia desse malogrado filme em Portugal, João Botelho apresenta ao público português um filme digno do seu nome e enobrecedor do cinema nacional. Adaptado do homónimo romance de Agustina Bessa Luís, “A Corte do Norte” conta-nos a história de Emília de Sousa, a maior actriz que o teatro português conheceu nos finais do séc. XIX, mas que abandonou por uns anos a carreira para se casar com o rico madeirense Gaspar de Barros e transformar-se na Baronesa Madalena do Mar. Tão bela quanto Sissi, a Imperatriz da Áustria, com quem conviveu no Inverno de 1860/61 e que decidiu construir um mistério que perdurou por quatro gerações e por mais de um século.
A estreia mundial desta obra ocorreu na edição de 2008 do prestigiado Festival de Cinema de Nova York, um certame constantemente aberto às obras nacionais, porque já recebeu em edições anteriores algumas produções portuguesas como “Fados” ou “Tempos Difíceis”. Após a sua exibição nesse Festival, “A Corte do Norte” colheu alguns elogios nos EUA, abrindo assim as portas para uma possível distribuição naquele país. Na minha opinião, essa distribuição seria perfeitamente justificável porque, apesar de não ser brilhante, esta obra de João Botelho aposta bastante na cultura nacional e na essência do cinema português, fazendo lembrar, em certas alturas, os filmes do grande mestre Manoel de Oliveira. Inicialmente, a adaptação cinematográfica de “A Corte do Norte” foi de exclusiva competência de José Álvaro Morais, mas este célebre cineasta português faleceu antes de ter tido hipótese de começar as gravações. O argumento que elaborou foi herdado por João Botelho, que aproveitou esta obra para prestar uma merecida homenagem a José Álvaro Morais e à própria Agustina Bessa Luís, a consagrada autora da história original que felizmente ainda permanece entre nós.
Terminada a contextualização desta produção, resta-me analisar o seu resultado final que pode ser visionado em sete salas de cinema espalhadas pelo território nacional (Lisboa, Porto, Braga, Viseu, Vila Real e Coimbra). “A Corte do Norte” leva-nos numa viagem temporal fortemente dramática entre 1860 e 1960, onde exploramos cinco gerações de mulheres que parecem partilhar a aptidão de um destino trágico. O argumento do filme alterna constantemente entre épocas à medida que vai relatando a triste e misteriosa saga familiar iniciada pela Baronesa Madalena do Mar. O filme desenvolve com algum cuidado a história das cinco personagens principais (Sissi, Rosalina, Emília de Sousa, Águeda e Rosamunde) que são todas brilhantemente interpretadas pela actriz Ana Moreira que assume, de corpo e alma, as diferentes faces e posturas das diversas gerações. É claro que esta constante mistura entre vidas e épocas dificulta um pouco a compreensão da história e os diversos mistérios que ela encerra, mas essa é precisamente a intenção do filme que não desvenda livremente nenhuma conclusão objectiva. Em última análise, cabe ao espectador a difícil tarefa de ligar as diversas mini-histórias para obter uma conclusão que contextualize e explique o complexo mas rico desenvolvimento.
O relato efectuado pelo argumento é maioritariamente acompanhado por belíssimas paisagens campestres que mostram alguns dos locais naturais mais belos de Portugal. À bela fotografia junta-se um grande trabalho de maquilhagem e guarda-roupa, que segue fielmente as diversas tendências das épocas que o filme retrata. A comandar a produção visual e narrativa esteve João Botelho, que apostou numa realização bastante pessoal que enaltece o melhor das várias personagens principais. A melhor prestação do elenco cabe à actriz Ana Moreira, que incorpora um impressionante total de sete personagens, das quais cinco assumem um papel fulcral na história. Os actores Aibeo Ricardo e Rogerio Samora também assumem uma prestação bastante agradável, e as suas personagens acabam por desanuviar um pouco o ambiente puramente feminista da história.
“A Corte do Norte” é um bom filme português que põem fim à recente remessa de obras nacionais de fraca qualidade ("Second Life" e "Contrato"). É sempre bom ver uma obra literária portuguesa ser adaptada ao cinema por um cineasta português porque, teoricamente, os portugueses conhecem melhor do que ninguém as intenções e pretensões dos seus congéneres.
Classificação - 3,5 Estrelas Em 5
2 Comentários
Acho que até o João Botelho deve ter vergonha de alguma vez ter feito um filme como o Corrupção. Em relação a este, ainda não vi, mas estou ansioso.
ResponderEliminar"A Corte do Norte" é um dos piores filmes que já vi! Compará-lo às "obras" do Manoel de Oliveira também não se pode dizer que seja propriamente um elogio. Resta.nos esperar que ambos os senhores morram ou se retirem, para dar lugar a verdadeiros talentos do cinema português, onde quer que eles estejam... Estes senhores consomem demasiados subsídios para tão fracos resultados, económicos e artísticos.
ResponderEliminar