Crítica - The Hunchback of Notre Dame (1996)


Realizado por Gary Trousdale e Kirk Wise
Com Tom Hulce, Demi Moore, Tony Jay

A Walt Disney apresentou em 1996, uma adaptação cinematográfica bastante livre e animada do clássico literário “Notre-Dame de Paris”, escrito pelo célebre autor francês Victor Hugo em 1831. Este valoroso empreendimento animado foi levado a cabo por Gary Trousdale e Kirk Wise, que já tinham realizado “Beauty & The Beast”, um dos grandes sucessos cinematográficos do poderoso estúdio de animação. Esta obra não alcançou o sucesso comercial de outros clássicos da Disney, mas conseguiu surpreender o público com a sua interessante história, que mistura um clima de festividade e romance com algumas temáticas bastante negras e complexas, como a divisão racial e a exacerbação do poder religioso.
O protagonista desta história é Quasímodo (Tom Hulce), um afável corcunda que vive enclausurado, desde a sua infância, na famosa catedral de Notre Dame. O seu guardião é o temível e poderoso Claude Frollo (Tony Jay), o Ministro da Justiça de Paris que assassinou a mãe de Quasimodo quando este era um recém-nascido, e que foi obrigado pelo pároco de Notre Dame a cuidar do bébé como forma de arrependimento pelo seu imperdoável acto. Durante anos, Quasímodo cresceu no centro da civilização, mas nunca pôde experimentar os grandes prazeres de Paris, porque as rígidas ordens de Frollo e o medo de não ser aceite pelas pessoas, impediam-no de abandonar a Catedral. Durante um famoso festival parisiense, Quasímodo, incitado pelas suas amigas gárgulas, decide aventurar-se na ilustre capital francesa. Durante a sua visita, e após ter atraído inúmeras atenções no festival, Quasímodo conhece a bela cigana Esmeralda (Demi Moore) que o salva da crueldade da sociedade, um acto heróico que arrebata o coração do jovem corcunda, mas que condena Esmeralda a uma perseguição religiosa por parte de Frollo que, posteriormente, também sucumbe aos encantos da jovem cigana. Febo (Kevin Kline), o novo capitão da guarda francesa, também se apaixona por Esmeralda e vai-se aliar a Quasímodo para tentar salvar a sua mútua paixão duma morte dolorosa na fogueira.
Esta obra desenvolve algumas temáticas que, até à data, não tinham qualquer lugar numa história de animação para crianças. “The Hunchback of Notre Dame” conseguiu a proeza de esconder numa história aparentemente romântica e heróica, alguns elementos que as crianças não percebem mas que os adultos poderão achar interessantes, nomeadamente o excessivo poder de uma justiça imperialista que descrimina claramente todos os cidadãos que não pertençam à raça dominante e o eterno confronto entre o paganismo e o catolicismo, que naquela época perseguia e condenava todos os praticantes de cultos não católicos à morte. Estas situações eram recorrentes naquela época e o filme transporta-as subtilmente para um enquadramento tipicamente infantil, que as utiliza como complemento da história central que aposta essencialmente numa vertente romântica entre Esmeralda, Frollo, Febo e Quasímodo e, numa perspectiva heróica, em relação a este último, que representa a possibilidade das pessoas fisicamente diferentes serem igualmente úteis para a sociedade. As crianças raramente se apercebem deste quadro lateral bastante negro e mesmo que se apercebam a mensagem que acaba por vincar nunca é prejudicial, porque apesar da sua natureza cruel, esses elementos secundários e históricos são retratados com alguma simplicidade e nunca atingem uma concretização violenta, excepção feita à cena da fogueira que quase mata Esmeralda e que representa a principal sentença de morte da Igreja para todas as “bruxas” daquela época.
As personagens desta história também exteriorizam um significado interessante, fruto de uma construção narrativa competente e apelativa. Quasímodo não é o melhor herói da Disney, mas é certamente um dos mais afáveis. Através da sua personalidade bondosa e altruísta, Quasímodo representa as melhores características da humanidade, mas a sua aparência incomum impede que a grande maioria das pessoas olhe para este corcunda com respeito e amizade. Esta personagem encerra um profundo ataque à superficialidade humana e à fraca valorização que nós fazemos das pessoas genuinamente agradáveis e que não devem muito à aparência física, pessoas essas que geralmente exibem uma fraca confiança em si e na sociedade que os rodeia. O Juiz Frollo é outra personagem bastante carismática e significativa que, juntamente com Scar (The Lion King) e com a Rainha Madrasta (Snow White & The Seven Dwarfs), se assume como um dos maiores vilões da Disney. Ao contrário de Quasímodo, esta personagem representa o pior da humanidade, exteriorizando assim as suas fragilidades mais visíveis como o impulso sexual e o ciúme. Este Juiz também representa o abuso da autoridade, o racismo e a crença exacerbada numa religião, características humanas que infelizmente ainda são comuns na nossa sociedade e que ainda provocam inúmeras atrocidades.
A clássica animação deste “The Hunchback of Notre Dame” é esplendorosa e exibe com algum pormenor a beleza de Paris e da fantástica Catedral de Notre Dame. Esse ilustre monumento, que serviu de inspiração para milhares de romances e aventuras ao longo dos anos, é retratado com algum detalhe que enaltece a sua beleza arquitectónica. No entanto, a vertente visual é substancialmente inferior à sua vertente musical que, na minha opinião, é um dos melhores complementos deste filme. As várias músicas que pautam o filme estão recheadas de significado que exteriorizam na perfeição o desenvolvimento da história. Allan Menken é o responsável pela criação deste virtuoso elemento que nos impressiona e nos comove. Entre as principais sonoridades encontramos o espectacular “Hellfire”, que é marivilhosamente interpretado por Frollo. “The Hunchback of Notre Dame” é uma obra inesquecível porque, para além de apostar em temáticas originais e inovadoras, consegue prender a atenção de um amplo espectro de espectadores com a sua banda sonora de qualidade e narrativa significativa.


Classificação - 4,5 Estrelas Em 5

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