Crítica – Coco Chanel & Igor Stravinsky (2009)

Realizado por Jan Kounen
Com Mads Mikkelsen, Anna Mouglalis, Yelena Morozova

O último ano assistiu a um súbito interesse pela vida amorosa da problemática estilista francesa Gabrielle Chanel. Depois de Coco avant Chanel de Anne Fontaine, o holandês Jan Kounen traz-nos mais uma obra sobre uma das ligações amorosas de Coco. Dotada por Anna Mouglalis de uma beleza que nunca teve, Coco Chanel é-nos apresentada como uma mulher à frente do seu tempo, extraordinariamente solitária, solidão essa reforçada pelo luto pela morte brusca e acidental do seu amante Boy, e profundamente decidida, ambiciosa e egoísta.
Numa recriação que, embora sem bases concretas para o afirmar, me pareceu algo duvidosa da coreografia concebida por Diaghilev para uma obra do compositor muito mal recebida pelo público parisiense, Coco Chanel fica impressionada com a coragem inventiva do Stravisnky (Mads Mikkelsen). Depois, de sentir que não lhe era indiferente e, ao saber que o compositor, refugiado em Paris depois da Revolução Russa, vivia com a mulher tuberculosa, os seus quatro filhos e uma empregada numa mansarda sem condições, onde, ainda assim, conseguia compor, ofereceu-lhe hospedagem numa casa que tinha no campo perto de Paris onde poderiam dispor de todo o conforto mas onde a própria Chanel se instala também. O desejo que o compositor nutria por esta mulher vai ser superior à fidelidade e amor à sua mulher e família e ambos iniciam uma pouco discreta relação assente em bases fortemente sexuais. A imagem que é transmitida é que a influência da estilista sobre o compositor foi nefasta e não necessariamente bem-intencionada. Quando percebe que Stranvinsky ama ainda a sua mulher Catherine (Yelena Morozova) que está sendo destruída pela tuberculose mas, ainda assim, luta com dignidade pela salvação do seu casamento, Coco faz uso do seu poder e dinheiro para, secretamente promover o amante e a sua Sagração da Primavera.


A história, a ter existido nestes moldes, é muito pouco dignificante para ambos os amantes e o modo como é aqui narrada não só pouca luz nos traz sobre a complexidade da personalidade dos dois génios, como nos mostra que até os génios se mostram pouco dignos quando se trata de atracções sexuais conotadas com o perigo e a o proibido. O desastroso final do filme corrobora esta ambiguidade da narração. A tentativa de dignificar os mais mesquinhos comportamentos humanos.
Tendo na memória recente Coco avant Chanel, não pude evitar pensar como, nos tempos que correm, dois realizadores completamente desinteressados promovem de forma tão óbvia a griffe em todo o seu esplendor. O guarda-roupa do filme é, de facto, o melhor de Chanel. Embora eu, pessoalmente, nunca tenha tido o privilegio de entrar na Casa Chanel de Paris, julgo que as escadarias interiores das loja , rodeadas de espelhos sejam iguais às retratadas no filme já que as mesma aprecem em Coco avant Chanel exactamente iguais. As pérolas, os famosos taillieurs Chanel, a criação do inigualável Chanel nº 5, são valorizados ao extremo, num contraste óbvio com o fraco tratamento da complexidade das personagens. Sem quaisquer provas reais, parece-me, ainda assim, muito estranho que seja feita no mesmo ano uma publicidade tão óbvia a uma marca ainda no mercado sem qualquer contrapartida económica. Ensombrado por essa suspeita e sem trazer à luz nenhuma aspecto realmente interessante da vida dos dois, para além de algumas relações sexuais semi-clandestinas, e alguns momentos com pretensões estéticas que não conseguem satisfazer, o filme desilude profundamente e fez-me, enquanto espectadora, sentir-me claramente manipulada no sentido de aderir à griffe e ao status, estilo e sofisticação que o usos dos seus produtos trazem a quem os usa.

Classificação - 3 Estrelas Em 5
Escrito por Ana Campos

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2 Comentários

  1. Alguém me poderia dizer quando estreia este filme e em que salas o podemos ver?

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  2. Excelentes observações... assisti ao filme e achei que apesar de bonito de se ver e ouvir, falta muita coisa nesse filme. A começar por uma boa atriz para Coco. Essa Anna Mouglalis é muito bonita e elegante, mas completamente inexpressiva... ser fria e arrogante não é o mesmo que ser vazia e ter sempre o mesmo tom de voz de quem está lendo o script.

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