Crítica - Copie Conforme (2010)

Realizado por Abbas Kiarostami
Com Juliette Binoche, William Shimell, Jean-Claude Carrière

O cineasta iraniano Abbas Kiarostami tem uma enorme simpatia pelas mulheres e pela sua mística feminina, assim sendo, não é de estranhar que a esmagadora maioria das suas obras se centrem em mulheres fortes e misteriosas que se vêm envolvidas em situações complexas que exaltam as suas melhores características. O seu novo trabalho, “Copie Conforme”, também segue esta fórmula feminista porque a sua história foca-se numa mulher forte e audaciosa que se vê subitamente envolvida num romance idílico que a vai obrigar a confrontar os seus maiores medos. É verdade que o seu enredo é extremamente subjectivo e intelectual, mas também é verdade que não aborda temáticas tão complexas ou polémicas como aquelas que foram abordas em obras como “Shirin (2008) ou “Taste Of Cherry” (1997), no entanto, este “Copie Conforme” não é um drama banal ou comercial, muito pelo contrário, é um interessante “exame” filosófico e intelectual sobre o amor/relações e o tempo, mas também sobre a essência da nossa existência. A sua história é protagonizada por James (William Shimell), um conhecido filósofo artístico e escritor inglês que vai até Lucignano na Toscana (Itália) para apresentar o seu mais recente livro sobre o valor artístico da cópia/réplica no mundo das artes. Após a sua conferência, James conhece Elle (Juliette Binoche), uma simpática galerista francesa que vive em Itália com o seu filho pré-adolescente. James e Elle decidem passear por Lucignano e durante esse passeio acabam por ser confundidos por um casal e por brincadeira decidem encenar esses papéis, no entanto, essa amigável encenação acaba por os aproximar romanticamente.


A sua narrativa é difícil de resumir ou de criticar porque a sua interpretação está muito dependente da opinião pessoal de cada espectador, no entanto, é possível identificar alguns dos temas que Kiarostami fez questão de destacar, assim sendo, somos confrontados com inúmeras alusões à arte e ao tempo, umas são mais subtis e significativas que outras mas a verdade é que ambos os temas estão intimamente ligados às duas personagens que protagonizam esta obra e aos seus temas centrais – o amor e a vida. James e Elle são especialistas em arte, assim sendo, esta está profundamente ligada às suas vidas que foram construídas e desenvolvidas à volta de certos ideias artísticos que ambos valorizam à sua maneira e que de certa forma tentam incutir às suas relações. James e Elle também estão ligados pelo tempo e pela sua inerente crueldade, no entanto, Elle acabou por ser a mais afectada pela irreverência do tempo e da própria vida, uma ideia que fica claramente patente na segunda metade desta obra. O aparente clima romântico entre James e Elle também é desenvolvido com muita delicadeza e qualidade, nunca atingindo um nível excessivamente romântico ou melodramático porque é pautado por uma extrema simplicidade que lhe confere um certo realismo e credibilidade, no entanto, este romance serve apenas como um mero complemento à verdadeira essência desta obra que tem como principal objectivo explorar a natureza da humanidade e a forma como esta é modificada e afectada por certas condicionantes. “Copie Conforme” é composto por maravilhosos diálogos entre James e Elle, diálogos esses que nos oferecem todos os elementos necessários para compreendermos esta produção que valoriza a nossa inteligência e a nossa sensibilidade através de vários apelos à nossa precepção, apelos que assumem a forma de metáforas e ironias que tornam mais complicada a nossa tarefa de objectificar este “Copie Conforme”. A sua conclusão acompanha a subjectividade da introdução e do desenvolvimento, deixando portanto o espectador sem muitas respostas a muitas perguntas que vão sendo levantadas, no entanto, cabe ao próprio espectador oferecer as respostas e preencher as lacunas com a sua própria interpretação dos vários acontecimentos desta obra e do extenso diálogo entre James e Elle. “Copie Conforme” é um maravilhoso trabalho de Abbas Kiarostami, um filme extremamente interessante que é ambientado num maravilhoso cenário e que nos obriga a reflectir sobre os vários temas e as várias questão que são levantadas pelos inúmeros diálogos entre James e Elle, duas personagens que são brilhantemente interpretadas por Juliette Binoche e William Shimell.

Classificação – 4 Estrelas Em 5

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4 Comentários

  1. É verdade que o filme se passa em um belíssimo lugar e tem atores maravilhosos, mas essa história de que por brincadeira passam a interpretar um casal, até me enganou no começo. No entanto, James que no início falava um italiano muito fraco e nada sabia de francês, passa a falar com fluência ambos os idiomas, tem uma crise ridícula no restaurante e nos deixa com dúvidas se isso foi brincadeira mesmo ou não. Isso sem contar que a questão dos idiomas permanece inexplicada. Idéia boa, mal executada, não sei se pelo roteirista ou pelo diretor. Não recomendo.

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  2. Mas o apenas aparente non sense do filme só reforça as amplas questões levantadas pelo diretor. É sutil, e explícito ao mesmo tempo. Não podemos pretender ler este filme sob uma ótica racional e objetiva: as nuances da própria vida, da arte, deslizam de um lado para outro. Quando podemos pretender mensurar ou determinar quando acontecem estes movimentos, estes vaivéns da vida? O filme apenas sussurra, e põe o espectador a se espelhar nele. Não por acaso os dois atores se vêem, em determinado momento, confrontados com o espelho. E nós, espectadores, estamos no lugar do espelho...
    Maravilhoso filme. Não me recordo de ter visto, ultimamente, obra contemporânea tão potente.

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  3. Kiarostami transita de modo admirável pela realidade própria da relação entre um homem e uma mulher. Concentra, nos diálogos e nos silêncios entre os dois, o que há de mais verdadeiro no encaminhamento da vida a dois. Como dito acima, cabe a nós, espectadores, colocarmo-nos no lugar do espelho. Mas, certamente, nem todos o fazem. Fica a impressão de que estes aguardam um desenlace mágico - que não se realiza. A vida prossegue. Não percebem que seremos nós, os espectadores, aqueles que darão continuidade ao roteiro, no enfrentamento das descobertas, das surpresas, das frustrações e realizações que a vida a dois nos prepara.

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  4. É uma obra adulta. Ilustra as dificuldades de se ser humano e as convenções na própria cópia acerca da completa falta de originalidade dos comportamententos de muitos indivíduos. Ótimo filme.
    Mas, feminista? rsrsrs Creio que há um equívoco grande em relacionar feminismo a este filme. Não há feminismo nenhum. É um personagem e longe de ser forte, independente e ...Feminista . rs

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