Crítica - Godzilla (2014)

Realizado por Gareth Edwards
Com Aaron Taylor-Johnson, Elizabeth Olsen, Bryan Cranston, Ken Watanabe

Todos temos ainda bem presente na memória a triste aventura de Godzilla – um dos monstros mais icónicos da 7ª Arte – passada nas terras do Tio Sam. Essa aventura de 1998 dirigida pelo inconstante Roland Emmerich pouca ou nenhuma justiça fez à aura de culto que acompanha o monstro radioativo mais famoso do mundo, transformando o clássico predador cuspidor de fogo numa espécie de versão rasca de um Tiranossauro Rex comedor de peixe. O resultado final dessa obra duvidosa foi de tal forma desastroso (o filme chegou a ser considerado um dos piores de 1998) que, durante muito tempo, ninguém no mundo do cinema quis sequer ouvir falar do nome Godzilla, nem que fosse pronunciado sob a forma de um sussurro virtualmente inaudível. Assim sendo, e como tantas vezes sucedeu com outras figuras memoráveis do cinema, o monstro nipónico viu-se forçado a ser enclausurado numa gaveta poeirenta até que os anos se encarregassem de limpar o seu bom nome e a sua boa imagem. Pois bem, 12 anos mais tarde, um certo rapaz chamado Gareth Edwards, acabadinho de sair da escola de cinema e com pouquíssimos recursos à sua disposição, decide fazer um dos mais belos e hipnotizantes filmes de monstros de que há memória: “Monsters”, unanimemente apontado como um dos melhores filmes de 2010 pela crítica especializada. Tudo leva a crer que o destino estava traçado. Edwards parecia ter nascido para dirigir o maior monstro da História do cinema. E após tanto tempo de clausura, Godzilla parecia estar pronto a renascer das cinzas e a ganhar novas forças com a ajuda do jovem e prometedor realizador britânico. Dito e feito. Sob as ordens de Edwards, Godzilla está de regresso ao seu esplendor. Renascido, reforçado, revitalizado e mais fiel às origens nipónicas do que alguma vez se poderia imaginar. Este novo “Godzilla” segue as desventuras de um parente afastado do dinossauro Tiranossauro Rex, que aparece em Manhattan à procura de sardinhas frescas. Aí, forma amizade com um cientista, uma repórter de televisão e um francês que gosta de falar como o Elvis Presley, mas começa a ficar chateado quando o exército dos EUA lhe destrói os ovos que tinha posto no lar em forma de gruta. Ok, estou a brincar. Ficaram assustados, não ficaram? Confessem que sim. Agora imaginem como se sentiram as audiências de 1998… Fora de brincadeiras, o “Godzilla” de Gareth Edwards acompanha a busca pela verdade de Joe (Bryan Cranston), um físico que pretende descobrir o que realmente esteve por detrás de um acidente ocorrido numa central nuclear japonesa. Com a ajuda do filho Ford (Aaron Taylor-Johnson), descobre de facto uma conspiração para ocultar a existência de um enorme monstro radioativo que pode colocar em risco o bem-estar da humanidade. E quando esse monstro desperta de um sono profundo e decide mostrar-se à humanidade, o caos toma de assalto os grandes centros civilizacionais.


“Godzilla” não é extraordinário, apresentando alguns defeitos que lhe custam alguns pontos. A narrativa salta tanto de um lado para o outro que se torna algo confusa e faz com que o enredo demore a evoluir. A figura central da história (o Ford de Aaron Taylor-Johnson) sofre um excesso de glorificação que não lhe assenta muito bem e que, de certa forma, infantiliza um pouco a narrativa. Já todos sabemos que Ford é o herói da fita, não precisam de o colocar a salvar criancinhas num comboio em apuros. Só faltava porem-no também a ajudar velhinhas indefesas a atravessar a rua. Todo o papel que o exército americano desempenha no decorrer da crise também não é muito convincente. E a forma como Godzilla se torna uma espécie de herói no ato final da película parece-me exagerada e, mais importante do que isso, desnecessária. Contudo, é justo dizer-se que todos estes pontos negativos não deitam por terra (nem por sombras) aquilo que o filme tem de melhor. Este é, sem dúvida, um blockbuster muito particular, possivelmente um blockbuster diferente de todos os outros que já tiveram oportunidade de ver. Sendo oriundo do cinema independente, Edwards empresta um pouco da irreverência e originalidade típicas desse tipo de cinema a este colosso cinematográfico de orçamento gigantesco, criando uma fita que tem o melhor dos dois mundos: a escala épica e os efeitos especiais de topo de um típico filme bombástico de verão, e a sensibilidade dramática e respeito pelo argumento característicos de um filme introspetivo de baixo orçamento. De facto, “Godzilla” é tão belo quanto aterrador, tão melancólico quanto expansivo, tão sentimental quanto espetacular. Em “Monsters”, Edwards praticamente manteve os monstros alienígenas afastados da câmara durante toda a película, dando azo ao filme de monstros mais contido e filosófico de sempre. Em “Godzilla”, Edwards volta a aplicar a mesma fórmula vencedora, mantendo o monstro na penumbra o máximo de tempo possível para intensificar o mistério e a própria tensão dos acontecimentos. É certo que isto pode não agradar a toda a gente, pois muitos decerto sentirão que a câmara se desvia da ação precisamente nos melhores momentos. Mas a verdade é que, ao recorrer a esta abordagem minimalista e quase fugidia, Edwards guarda os grandes confrontos para o ato final e isso faz com que esse final seja ainda mais explosivo. Tecnicamente, “Godzilla” é irrepreensível. E o bom elenco garante-lhe uma alma que nem sempre se consegue encontrar nos filmes de grande orçamento. Elizabeth Olsen, por exemplo, é comovente no seu papel de mãe e esposa aflita. E Bryan Cranston brilha na pele do físico desesperado que todos julgam estar louco. Em suma, “Godzilla” não é perfeito, mas devolve a honra a um herói nipónico de orgulho ferido e assume-se desde já como o melhor blockbuster de 2014. Gojira está de volta à grande forma e que bom que isso é para os amantes do cinema-pipoca.
Classificação – 3,5 Estrelas em 5

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