Com Benedict Cumberbatch, Keira Knightley, Matthew Goode
Há que dizer, antes de mais, que "The Imitation Game" é uma cinebiografia muito competente do matemático britânico Alan Turing, mas infelizmente está longe de ser uma daquelas cinebiografias empolgantes que consegue marcar a diferença junto do espectador, pelo menos confesso que após o seu final não senti grande apego por esta obra ou pela história que retrata, no fundo não senti aquele intenso despertar de curiosidade pelos feitos ou pela história de vida de Turing, algo estranho porque basta uma breve pesquisa na internet para perceber que esta personalidade britânica teve uma vida digna, literalmente, de um grande filme. É certo que "The Imitation Game" consegue elucidar sobre os principais aspetos da vida desta importante personalidade, mas falhou na hora de conseguir cativar-me para a sua grandiosidade e espetacularidade humana, cientifica e histórica, no fundo, fiquei com a sensação que "The Imitation Game" não vendeu ou retratou adequadamente a história verídica que explora, não por causa da ausência de factos históricos, mas por causa de uma clara ausência de entusiasmo e calor humano na hora de puxar pela história em si e empolgar o espectador com o retrato que é feito da vida de Alan Turing.
O que resulta desta obra é, portanto, um retrato histórico mas frio de parte da vida de Alan Turing, um importante matemático britânico que, durante a 2º Guerra Mundial, trabalhou em segredo para o Exército Britânico e conseguiu criar, juntamente com um grupo de académicos igualmente brilhantes, uma máquina impressionante que é atualmente considerada um dos primeiros computadores do mundo e que foi capaz de quebrar o até aí indecifrável Código da Enigma, a máquina utilizada pelos Nazis para transmitir informações codificadas às suas tropas. Esta genial invenção de Turing foi fundamental para o desfecho da 2ª Guerra Mundial, que sem esta invenção poderia ter durado durante muitos mais anos e causado muitas mais mortes. Neste sentido, Turing foi um verdadeiro herói de guerra, mas os seus esforços e contribuições só se tornaram conhecidas do público geral muitos anos após a sua morte em 1954, dois anos após ter sido acusado e condenado por uma ofensa criminal de homossexualidade que, infelizmente, catapultou-o para um clima de depressão do qual nunca conseguiu recuperar.
Todos estes factos são explorados com muita objetividade, mas falta algo de humano e sentimental neste retrato histórico que, na minha ótica, poderia ter dado origem a um filme mais empolgante e não meramente competente. É certo que, a nível pessoal, "The Imitation Game" traça um retrato curioso de Alan Turning, dando enfase às peculiaridades da sua personalidade e à sua clara ausência de capacidades sociais, mas peca na hora de conseguir ligar o espectador ao seu lado emocional e humano. É verdade que a sua orientação sexual e os seus dilemas internos em relação à mesma são explorados com dignidade e são contextualizados com algum detalhe, mas mesmo neste ponto sensível falta algo mais, porque apesar de ser historicamente competente, este retrato não é levado para além da mera curiosidade. É este o problema do filme, porque ficamos sempre com a sensação que toda a cinebiografia obedece a certos limites puramente objetivos e sem qualquer risco inerente que, infelizmente, fazem com que todo o filme tenha um nível ameno e um ambiente até bastante frio e calculista.
É impossível negar que Benedict Cumberbatch tem uma grande preformance na pele de Turning, provavelmente uma das melhores da sua carreira, mas mesmo esta preformance entusiasta e realista não consegue transmitir aquele espírito de curiosidade e interesse humano a esta produção cinebiográfica que, realmente, tem na sua génese uma história de vida fenomenal que, com mais ambição e risco, poderia ter dado origem a uma das cinebiografias mais poderosas dos últimos anos. E tal poderia ter acontecido não só por causa dos impressionantes aspetos profissionais da vida de Turing, mas especialmente por causa dos seus aspetos pessoais, sobretudo os que estão relacionados com os eventos que marcaram os últimos anos da sua vida e que têm o poder para mudarem mentalidades e servirem como alertas morais e humanitários sobre a questão dos efeitos nefastos dos estigmas da homossexualidade. Não se pode negar que "The Imitation Game" aprofunda, com objetividade e algum contexto, a parte da vida de Turing em que este trabalhou para ajudar o Reino Unido contra os Nazis, mas mesmo este retrato, apesar de muito competente, peca pela sua frieza que, infelizmente, alastra-se a outros campos e não permite, por exemplo, explorar com um maior cuidado moral a parte final da vida do matemático.
É também impossível de negar que "The Imitation Game" está bem conseguido de um ponto de vista técnico e tem vários pontos positivos a seu favor, como por exemplo as prestações de Benedict Cumberbath e Keira Knightley, sendo por isso, sem grande contestação, um dos grandes filmes de 2014, mas não é de todo memorável e, apesar de ter conquistado uma nomeação ao Óscar de Melhor Filme de 2014, está longe, muito longe, de ser magistral ou até de ser um candidato de topo aos prémios da Academia. O que é certo é que, objetivamente, explora com competência histórica uma parte importante da vida de Turing e da história da Humanidade, mas para mim falha no resto e fica, por isso, aquém das expectativas e daquilo que poderia ter sido.
Classificação - 3,5 Estrelas em 5
3 Comentários
“(…) peca pela frieza…”?! Desculpe, João, mas de todo concordo consigo neste ponto. Na minha opinião, a performance magistral de Benedict Cumberbatch (como bem diz o João) releva e respira, na perfeição, a sensibilidade e humanidade enclausuradas em Alan Turing. Ele apenas precisava de accionar, ou que lhe accionassem (coube à Joan, Keira Knightley, ter esse papel), um botão para as libertar. Só não sente/vê essa sensibilidade escondida quem não estiver a viver plenamente o filme, de coração aberto, olhando-o/vendo-o apenas com o olho técnico e/ou de crítica. Mais sobre a vida pessoal e social de Turing e estaríamos a ver só e apenas a vida privada de Turing, o que creio não ter sido (e ainda bem) essa a intenção nem do realizador, Morten Tyldum, nem do argumentista, Graham Moore, o qual, aliás, ganhou o Óscar do melhor argumento adaptado. Penso que a ideia básica do filme era dar a conhecer ao mundo (muitos de nós desconhecia Alan Turing, eu incluída) uma das figuras que alterou completamente o rumo da história da Segunda Guerra Mundial, antecipando o final da mesma e, assim, evitando mais milhares de mortes. Não fosse este filme, jamais saberíamos dos seus tantos e grandes feitos… O último diálogo entre ele e a Joan, no qual ela lhe disse a diferença que ele fez neste mundo, é fabulosamente emocionante. Depois ver o filme, a vontade é a de pesquisar mais sobre a vida e obra deste homem. Repare que ele só ganhou o perdão real, 50 anos depois, e pelo facto de ter sido condenado por conduta homossexual ilegal, e não pela sua extraordinária ciência não ter sido reconhecida e valorizada devidamente no tempo e espaços certos.
ResponderEliminarEu adorei o filme e recomendo-o vivamente. Emocionou-me “to the core of my heart". Vi-o duas vezes, e não detectei nenhuma falha em nenhumas das categorias: técnica, interpretação, argumento, adaptação, fotografia, etc. Achei-o perfeito. “To the point”; “Just enough”. O suficiente para gostar, envolver, perceber, conhecer e o suficiente para aguçar o interesse em saber mais sobre esse extraordinário homem que foi Alan Turing.
“All the best. Keep up the good work!” :)
Lúcia Catarino
Fico feliz por ter gostado Lúcia, mas confesso que a mim o filme não me disse muito :)
EliminarQue seria do amarelo se todos gostássemos do azul, não é mesmo?! ;)
EliminarNão faz mal! Eu gostei muito por si. Amei, aliás! Senti tanto carinho por ele, tanto! Um jovem e homem incompreendido e mal tratado. Só a Joan viu-o para além do visível. :)
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