Crítica - Up In The Air (2009)

Realizado por Jason Reitman
Com George Clooney, Vera Farmiga, Anna Kendrick

A terceira longa-metragem de Jason Reitman não irá desiludir os espectadores que apreciem produções subjectivas e intelectuais que versem sobre temáticas actuais e mediáticas, no entanto, convém realçar que “Up In The Air” não é dramaticamente excepcional porque raramente nos consegue transmitir alguma emoção através da sua história e das suas respectivas mensagens, assim sendo, estamos perante um trabalho cinematográfico que nos apresenta um argumento intelectualmente perfeito mas emocionalmente incompleto. Ryan Bingham (George Clooney) é um quarentão empedernido e misantropo que não se interessa por compromissos românticos. A sua especialidade é despedir pessoas, reformulando as necessidades empresariais com vista à maximização de recursos, assim sendo, está sempre a viajar em trabalho, levando sempre consigo uma bagagem minimalista que apenas contem o indispensável, um facto que aproveita para saciar a sua compulsão em coleccionar milhas aéreas, no entanto, quando está prestes a atingir o objectivo das dez milhões de milhas como cliente regular, o seu patrão decide aplicar-lhe o seu próprio conceito de maximização de recursos e decide alterar o método de trabalho, fazendo-o cumprir as suas funções através de vídeo-conferência, uma alteração que inicialmente não lhe assenta muito bem mas que posteriormente vai transformar a sua existência. Ryan também inicia uma espécie de relação amorosa com Alex Goran (Vera Farmiga), uma encantadora empresária que conseguiu cativar este solteiro incansável que agora tem a simples perspectiva de assentar e começar uma família.


O argumento de “Up In The Air” é baseado no homónimo romance literário de Walter Kirn e explora algumas temáticas bastante importantes da sociedade contemporânea, nomeadamente a instabilidade financeira dos mercados económicos e das inúmeras empresas que são directamente afectadas pelos sucessivos problemas da economia mundial, uma instabilidade empresarial que conduz ao despedimento de milhões de pessoas que subitamente ficam economicamente desamparadas e socialmente desesperadas porque perderam a sua segurança e a sua independência financeira. É dentro deste contexto desolador que se encontra o quotidiano da personagem principal de “Up In The Air”, um homem que despede pessoas e as auxilia a seguirem o seu caminho, assim sendo, este é um trabalho bastante árduo e ingrato mas que é visto por esta personagem como uma oportunidade para ajudar os indesejados a seguirem em frente, uma visão excessivamente optimista mas nitidamente enganadora porque muitos dos seus indesejados acabam por enveredar por caminhos dramáticos, como por exemplo, o suicídio. A insensibilidade necessária para cumprir este complicado trabalho na perfeição é claramente responsável pelo crescente isolamento romântico desta personagem que apenas se interessa por duas coisas, coleccionar milhas aéreas e despenhar a sua função profissional da melhor forma. A organização do seu quotidiano corresponde à organização de um aeroporto, ou seja, existe em ambos os casos uma preocupação completa pela organização metodológica e pelo profissionalismo exacerbado mas uma total ausência de improvisação e emoção genuína. À medida que nos aproximamos da conclusão da história, este homem inicialmente solitário começa a desenvolver uma personalidade mais colectiva que eventualmente o leva a desejar uma família e muitas outras coisas que inicialmente considerava dispensáveis mas que agora são claramente preferíveis aos seus antigos sonhos e ambições, assim se explica a sua desinteressada reacção quando finalmente cumpre um dos seus antigos objectivos, coleccionar um numero impressionante de milhas áreas e ser congratulado por isso. A sua evolução sociológica foi conseguida através do aparecimento de um interesse romântico e da reestruturação do seu trabalho, que se dá quando o seu patrão decide seguir o concelho de uma empresária em ascensão e obriga todos os seus funcionários a executarem as suas funções através da Internet, uma medida que simboliza o crescente processo de desumanização da indústria empresarial porque diminui ainda mais o contacto humano entre entidades e sujeitos. Esta nova metodologia obriga este executivo solitário a assentar permanentemente numa cidade e a dispensar as suas adoradas viagens de avião, mas também lhe permite momentos de reflexão que despontam o inicio de uma conturbada relação amorosa com uma misteriosa mulher, no entanto, esse romance acaba por não ser muito emotivo ou cativante e a sua conclusão, embora inesperada, é insipidamente explorada pelo argumento. O trabalho narrativo de Jason Reitman e Sheldon Turner não é excepcionalmente perfeito, mas é bastante engenhoso e intelectual porque esta fantástica dupla conseguiu desenvolver uma história substancialmente interessante que está repleta de indirectas aos vários sectores políticos e económicos da sociedade norte-americana, no entanto, esse desenvolvimento não nos oferece grandes momentos de intensidade emocional porque em nenhum momento somos confrontados com situações que nos fazem reagir ou sentir, ou seja, não nos conseguimos preocupar com o destino das personagens nem nos conseguimos interligar com as suas emoções, assim sendo, “Up In The Air” é intelectualmente estimulante mas emocionalmente monótono e aborrecido.


A direcção de Jason Reitman é positiva mas substancialmente imperfeita porque este talentoso cineasta nunca conseguiu transmitir a emoção necessária ao argumento, no entanto, esteticamente é perfeita porque aproveitou a estética funcional dos terminais dos aeroportos para incutir um ambiente automatizado à produção mas à medida que a personagem principal começa a abandonar a sua personalidade perfeccionista começamos a entrar num ambiente mais imprevisível e familiar que é abruptamente interrompido pelos acontecimentos da conclusão, uma mudança que cai muitíssimo bem. A fotografia estilizada e as suavizantes sonoridades também contribuiriam para o sucesso desta competente realização. O elenco é liderado por George Clooney que nos consegue oferecer uma talentosa performance que incorpora na perfeição a solidão do mundo corporativo e a ambição da humanidade, no entanto, esta sua prestação não nos transmite nenhuma emoção verdadeiramente genuína e credível, uma falha que deriva directamente do argumento. Vera Farmiga e Anna Kendrick abrilhantam o elenco secundário com performances individuais bastante interessantes. O engenhoso argumento de “Up In The Air” é admirável e é claramente o seu ponto forte mas também funciona como o seu único ponto fraco porque a sua excessiva automatização impediu o desenvolvimento de uma ligação mais emocional e mais pessoal com o espectador que assim se perde facilmente no calculismo da história, assim sendo, podemos concluir que “Up In The Air” é uma excelente produção cinematográfica que infelizmente adoptou algumas das piores características do seu protagonista dramaticamente aborrecido mas intelectualmente estimulante.

Classificação – 4,5 Estrelas Em 5

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7 Comentários

  1. JT permite-me discordar de ti... não acho que seja um filme emocionalmente monótono e aborrecido... muito pelo contrário. Acho que é mais um daqueles exercícios de cinema que tocam profundamente pela sua simplicidade... o contraste entre um homem que ganha a vida de luxo e privilegio que tem ao despedir pessoas e a vida diária de todos os que vão perdendo o seu trabalho é brutal. Ao ver este filme senti um ligeiro desconforto pela forma como a nossa sociedade se vai organizando... talvez seja uma leitura muito pessoal da minha parte, mas retiro completamente essa ideia de aborrecimento emocional...

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  2. Tenho que concordar com o que o Ricardo Marques disse!!! Não acho que o filme seja emocionalmente monótono...Talvez não seja emocionalmente impactante à primeira vista...mas é uma filme que faz pensar... principalmente para onde a sociedade está a evoluir...

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  3. Sim, é um filme que faz pensar e é por isso que intelectualmente é quase perfeito, no entanto, em nenhum momento ficamos interligados com as personagens e o próprio romance é tão seco em emoção e amor.

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  4. Percebo o ponto de vista... ainda assim, acho que a força deste filme está precisamente na forma como segmenta a audiência... o amor aqui é só um acessório... parece-me que o argumento central está no contraste entre esta personagem central e tudo o mais...

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  5. Aqui está um filme que foi extremamente favorecido devido à - excessiva - campanhã de marketing que foi feita à volta dele.

    Tem alguns pontos interessantes, entre eles, o contraste em que o emprego de um, simboliza o desemprego dos outros; o (aparente) controlo do protagonista sobre tudo o que se passa à sua volta, excepto [cliché] sobre o amor e até mesmo como o Ricardo Marques disse "ligeiro desconforto pela forma como a nossa sociedade se vai organizando".

    Apesar disso, não considero um excelente filme. Do Jason Reitman esperava-se mais (depois do "Juno". O George, porém, esteve francamente bem.

    Este foi o filme que ganhou o melhor argumento nos globos de ouro. Para mim, não está ao nível do "Inglourious Basterds" do Tarantino. Digam-me qual é a cena que "bate" a do Waltz a entrar em casa do lenhador?

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  6. ...a controversia tem sempre um porquê...

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