Crítica - Black Mass (2015)

Realizado por Scott Cooper
Com Johnny Depp, Dakota Johnsson, Benedict Cumberbatch

O único apontamento inegavelmente positivo de "Black Mass" prende-se com a fantástica performance de Johnny Depp, que assim coloca um ponto final a uma série muito negativa de prestações menos conseguidas em obras igualmente medianas, como "Transcendence" (2014), "Mortdecai" (2015) ou "The Lone Ranger" (2013). Na pele do infame gangster Whitey Bulger, que entre os Anos 1950 e 1990 dominou e aterrorizou Boston, Depp apresenta uma das melhores performances dos últimos anos e até da sua já extensa carreira, fazendo-nos recordar daquele Depp carismático e brilhante que nos cativou em obras como "Ed Wood" (1994) ou "Pirates of the Caribbean: The Curse of the Black Pearl" (2003). Não é portanto descabido pensar e apostar que Depp poderá, como já se previa, apresentar uma forte candidatura ao Óscar de Melhor Ator Principal, já que esta sua convincente prestação tem pernas para andar nessa valorosa direção. 
Já o próprio "Black Mass", a quem também lhe era reconhecido fortes possibilidades de conseguir, pelo menos, algumas nomeações em categorias técnicas relevantes, poderá ter mais dificuldades em atingir este fim, não que seja um filme básico ou mediano, porque efetivamente não o é, mas porque não é um daqueles filmes únicos, memoráveis e fantásticos que se mostram capazes de surpreender ou deixar os espectadores deslumbrados e rendidos à sua inerente espectacularidade. É claro que tal não significa que não possa chegar, quem sabe, a uma nomeação ao Óscar de Melhor Filme ou até Argumento Adaptado, como também não significa que "Black Mass" é apenas mais um simples filme de gangsters que pouco acrescenta ao género, mas atendendo à capacidade que a sua base verídica teria para cativar o espectador seria de esperar uma oferta de entretenimento mais única, intensa e interessante por parte desta obra que, pese embora a brilhante capacidade profissional demonstrada pelo seu talentoso elenco e pelo seu cineasta bem intencionado, acaba por nunca superar a sombra das suas expectativas.



Baseado no homónimo livro best-seller de Dick Lehr e Gerard O'Neill, "Black Mass" pode ser descrito como uma cinebiografia parcial do famoso gangster Whitey Bugler. E apelido-a de parcial porque apenas se foca numa parte específica da vida deste homem, sendo que tal focalização até é bastante positiva e benéfica para este produto, já que este momento específico da sua vida atribulada é efetivamente o único que é digno de um maior registo e importância. Foi precisamente entre as Décadas de 70 e 90 que Bugler mais se destacou, junto da polícia e do público, com as suas atividades criminais que envolveram, entre outras, crimes de homicídio ou burla e até colaborações mal intencionadas com o FBI, cujos contextos mais negros são aqui explorados com uma certa aptidão para o teor jornalístico mas sem aquela tão indispensável componente emotiva e humana que qualquer excelente filme de gangsters tem que apresentar para se destacar. 
Este retrato criminal, policial e humano é portanto alvo de uma abordagem generalista bastante competente do ponto de vista informativo, mas embora não se possa apontar a "Black Mass" grandes falhas de contexto ou realismo à forma como são exploradas as conspirações e peripécias criminais de Whitey Bugler, pode-se apontar uma certa ausência de tensão, emoção e sobretudo audácia na representação que esta obra promove dessa jornada, do complexo mundo do crime que nos apresentado e das múltiplas questões morais que estão no seu cerne. Pode-se até aplaudir a decisão dos seus responsáveis em apostar num argumento próximo a uma comprovada base verídica que, ainda por cima, esforça-se por não se perder em demasia em questões desnecessárias ou secundárias que roçam os estereótipos banais ou a futilidade cinematográfica. Mas por outro lado tem que se atacar o mesmo argumento por raramente ultrapassar a simples exposição criminal e por não conseguir expor de forma eficaz ou natural a componente humana que se esconde por detrás de uma história tão apelativa como esta. 


É certo que estamos perante um filme explícito que se mostra fiel à sua génese jornalística e cinebiográfica, mas como um filme de gangster propriamente dito, "Black Mass" não consegue motivar ou cativar quem o vê para atingir os níveis de satisfação que os seus produtores certamente pretendiam. Isto porque falha em agraciar o seu polémico retrato biográfico com um complemento moral e humano igualmente denso e intenso que nos transporte, eficazmente, até aos bastidores do complexo universo dos criminosos americanos ou até aos meandros mais sombrios da mente distorcida de um protagonista muito cativante mas pobremente explorado.
É bem verdade que ninguém pode afirmar que "Black Mass" não é um produto criminalmente violento, sério ou até minimamente interessante, mas o que efetivamente se lhe pode apontar como um destaque negativo e preocupante é a forma displicente como a sua intriga criminal negligencia constantemente a exploração de reais elementos humanos e morais que poderiam apimentar este produto e elevar a sua propensão dramática. É por causa da sua fórmula demasiado simples que apenas somos confrontados com um retrato biograficamente competente e muitas vezes expressivo do ponto de vista da violência e do crime, mas que é incompreensivelmente opaco em emoções e moralidades, perdendo-se assim demasiadas vezes em pobres diálogos sem qualquer vigor dramático que falham em disfarçar a sua pobreza moral. O mesmo também se aplica às fortes sequências de violência que se focam mais na barbaridade dos actos perpetrados pelos protagonistas do que, propriamente, no jogo psicológico que as rodeiam e nas questões dramáticas e humanas que tais ações desencadeiam ou evidenciam no seio da trama. 
Em suma, "Black Mass" é, por muito que se custe dizer, um produto moralmente e intelectualmente incapaz e inexpressivo que , no fundo, apenas expõem em linhas demasiado lineares uma vida de crime e violência com muita proximidade à realidade, mas sem aquele ímpeto dramático, humano e intenso que deveria conter, apesar de tal retrato ter os seus pontos positivos no que toca à exposição credível de uma história real e interessante. Uma vez mais reforço que estamos perante um filme tecnicamente competente que até conta com uma certa dose de interesse criminal associado à sua trama, mas o problema é que num quadro geral torna-se incompleto e desequilibrado precisamente por causa da já supra referida ausência de um ponto de vista mais íntimo e tenso relativamente ao seu protagonista e ao complexo cenário criminal que o rodeia. Isto leva a que, no final, qualquer espectador fique com uma espécie de sentimento agridoce relativamente a este tão badalado projeto, no qual o competente realizador Scott Cooper e um elenco profissional liderado por um inspirado Johnny Deep até anotam prestações consideravelmente positivas que, infelizmente, entram em conflito com um argumento menos conseguido e pensado que, na falta de melhor descrição, pode mesmo ser considerado desequilibrado por não estabelecer a tão essencial ponte sustentável e criativa entre o realismo, a ficção, a violência e a moralidade. O mesmo já não se passa em outros filmes de gangsters já consagrados, como o recente "The Departed" ou os clássicos "The Godfather" (1972) e "Goodfellas" (1990), que conseguiram incutir ao espectador aquele motivador e balançado clique de intensidade, drama, entretenimento e furor que escapa a "Black Mass".

Classificação - 3,5 Estrelas em 5

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1 Comentários

  1. Quem deu o poder intimidante à personagem? O actor ou a maquilhagem?
    Eu relembro a interpretação do Jack Nicholson e penso. "Ai se ele tivesse esta brilhante maquilhagem"
    Eu imagino, um Richard Burton ou James Cagney a interpretar esta personagem e acredito que seriam tão intimidantes como foi o Jonny...mas sem maquilhagem.
    É um filme que se vê bem, mas não é nenhum espectáculo. Vale a ida ao cinema
    Oscar para o jonny deep? Não sei porque. Foi uma papel normal. Ponham é maquilhagem na lista de oscars, porque deu um grande contributo à personagem.

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