Crítica - Pulp Fiction (1994)

Realizado por Quentin Tarantino
Com John Travolta, Samuel L. Jackson, Tim Roth

Antes de iniciar esta crítica, propriamente dita, há que salientar uma outra obra - prima de Tarantino, comparando-a com o Pulp Fiction (o filme "alvo"): "Cães de Aluguer", filme de estreia de Tarantino, é um filme recheado de muita acção misturada com humor negro, condimentando uma história contada de uma forma totalmente não - linear. A diferença entre a estrutura de "Cães de Aluguer" e a de "Pulp Fiction" é que, no primeiro existe um Presente que nos vai guiando pelos flashbacks dados pelo filme, dando uma certa estruturação linear à história; Em "Pulp Fiction", Tarantino conta a história de forma absolutamente não - linear, sem fio condutor, sem um tempo definido que nos sirva de base, o que, no entanto, não faz com que nos percamos na história. "Pulp Fiction" é uma narrativa fragmentada extremamente original. É um emaranhado de histórias e de personagens completamente distintas, aplicadas num conjunto de montagens e de planos, formando assim uma estética / estrutura geral absolutamente perfeita. "Pulp Fiction" é um filme de ritmo rápido, com imensos plots e sub-plots, o que lhe confere uma dinâmica, para além da rapidez, e uma riqueza únicas. Toda a estética de montagem serve de esqueleto a, não uma, mas a três histórias com a temática do submundo do crime, onde todas elas possuem personagens em comum (personagens - tipo).

Após uma pequena introdução, onde um jovem casal de assaltantes conversa tranquilamente sobre assaltos, num restaurante (recurso à Analepse, pois o filme termina com esta mesma cena, concluindo-a), Tarantino começa então a narrar a sua primeira história: Vinvent Vega (John Travolta) deve levar a esposa do Chefe ("Marcellus Wallace"), Mia Wallace (Uma Thurman) a jantar fora e diverti-la / entretê-la, enquanto Mr. Wallace se ausenta numa viagem de negócios à Florida. A segunda história (já em forma não - cronológica) fala de um boxeur, Butch ( Bruce Willis ), que já é considerado velho para o exercício da sua profissão e que recebe uma quantia em dinheiro, de Marcellus, para perder o combate. A terceira história tem como foco principal, a personagem Jules Winnfield (Samuel L. Jackson), com Travolta como coadjuvante, que devem limpar o carro, após um assassinato extremamente violento, apesar de acidental, no banco traseiro. "Pulp Fiction" é um filme, que à primeira vista parece não ter qualquer nexo, e cujo realizador parece ser completamente louco; o facto de esta última característica ser absolutamente verdadeira, é o que dá a "Pulp Fiction" o seu carácter único e irrepetível, uma verdadeira obra-prima. Um outro aspecto que há a salientar em "Pulp Fiction" é o modo como Tarantino fala sobre assuntos extremamente delicados, tão peculiarmente. Os diálogos são fortes e extremamente bem construídos, maior parte das vezes apresentando um humor negro sobre diversas situações que não deveriam ser engraçadas; e a naturalidade com que as drogas e a violência são tratadas no quotidiano das personagens. E como as histórias parecem estar desconectadas umas das outras, tudo parece uma confusão generalizada, acabamos por encontrar o cerne da definição "Pulp", dada no início do filme, dando-lhe, nós, um sentido automático no contexto principal do filme. Após um promissor início de carreira, Travolta estava em pleno esquecimento quando recebeu o convite para participar no "Pulp Fiction". Tarantino escreveu uma sequência inteira só para Travolta, logicamente a que ele dança no bar com a personagem de Uma Thurman, o célebre Twist Contest; nos momentos de tensão, como a cena do w.c. na casa de butch; ou então na cena final da história de Jules Winnfield; Travolta está perfeito: o seu olhar, a maneira de falar, a maneira de andar, etc, terá sido, muito provavelmente, o papel mais bem interpretado da vida de John Travolta.

Samuel L. Jackson protagonizou "Pulp Fiction" e "Jackie Brown", e em ambos o actor está excelente. Embora os papéis sejam diferentes, a diferença da frieza de Jules Winnfield e a malandragem do traficante de armas de Ordell Robbie, só é perceptível devido ao trabalho notável do actor. O cabelo e o bigode que Samuel L. Jackson usa em "Pulp Fiction", imortalizaram a sua imagem. Nas cenas de tensão, Jackson consegue impor um ar que não permite ao espectador desviar a sua atenção até ao final da cena, principalmente quando começa a recitar a passagem da Bíblia de Ezequiel - 25:17, que fala sobre vingança. Bruce Willis não tem um papel muito diferente do que estamos habituados a ver: duro, violento, etc. No entanto, as situações impostas por Tarantino fazem com que Bruce Willis faça a melhor interpretação da sua carreira. É impossível esquecer a sua fuga no táxi (o background desta cena está, simplesmente, espectacular), o modo como trata o relógio herdado do pai (e toda a história do relógio, até chegar às suas mãos), o momento na loja em que ele vai largando uma arma após ver outra melhor e mais mortífera com um olhar esgazeado, etc. Uma Thurman divide com Travolta a importância da primeira história, sendo uma coadjuvante de luxo. Encarna com um charme magistral Mia Wallace, a esposa do Chefe de Travolta. O modo como a actriz interpreta o uso de drogas é fantástico, principalmente na parte final da sua história, quando desencadeia aquela situação dificílima para Vincent Vega; a sua interpretação nessa parte da história (toda a viagem de Vincent Vega até casa do seu fornecedor de droga, para que este administre uma injecção de Adrenalina a Mia ) é marcante, captando a mais absoluta atenção do espectador.

Quentin Tarantino, como de costume em todos os seus filmes, faz de Jimmie em "Pulp Fiction", o homem que cede a sua casa e alguns haveres para que Travolta e Jackson limpem o carro na terceira história. Quentin estava indeciso entre fazer de Jimmie, o dono da casa, ou de traficante a quem o Vincent comprava a droga; decidiu-se por Jimmie, não pela facilidade de interpretação, mas sim por querer estar atrás das câmaras aquando da cena da overdose de Mia Wallace ( cena esta, que é chocante e que consegue alcançar todas as suas pretensões - brilhante ). Além do já supracitado método de montagem que usou no filme, tem um controle total dos actores e dos espectadores durante o filme inteiro. Escolheu por várias vezes planos longos, sem cansarem o espectador ou sem deixarem que este perca o interesse pela cena, devido ao texto extremamente bem escrito; um exemplo disso verifica-se logo no início do filme, quando Vincent e Jules vão fazer um serviço a Mr. Wallace e vêem que estão adiantados na hora, pontuais que são - nesse momento passam-se mais de dois minutos com os dois conversando sobre maldades, ou então acerca de uma lendária massagem que se diz ter feito com que Mr. Wallace mandasse um homem pela janela. Tarantino também utiliza ângulos de câmara pouco convencionais que resultam na perfeição, em vez de deixarem o espectador incomodado com a cena.

A não esquecer está a Banda Sonora de "Pulp Fiction", que para além de ter imortalizado o filme, imortalizou as músicas em si, que talvez ao serem ouvidas noutro filme qualquer, hoje em dia não trariam qualquer relevância ao ouvinte. Temas como "Girl, You'll be a Woman Soon", "Dark Night", "Jungle Boogie", "Comanche", "Flowers on the Wall", "Stay Together", "Surf Rider", "Lonesome Town", "Son of a Preacher Man", entre muitas outras, deram um dinamismo autêntico a "Pulp Fiction", dando verdadeiramente vida e sentido a cada cena, sendo muito mais do que um complemento cinematográfico. "Pulp Fiction" é uma obra genial, a prova de que Quentin Tarantino nasceu para revolucionar o cinema independente americano. "Pulp Fiction" é sem dúvida, o melhor filme de todos os tempos.

Classificação - 5 Estrelas Em 5

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