Crítica - Harry Potter and the Order of the Phoenix (2007)


Realizado por David Yates
Com Daniel Radcliffe, Emma Watson, Rupert Grint, Helena Bonham-Carter, Ralph Fiennes

We’ve all got both light and dark inside of us. What matters is the part we choose to act on. That’s who we really are.

(Este texto contém spoilers.)

Harry Potter e a Ordem da Fénix foi o primeiro filme da saga realizado pelo britânico David Yates, que viria a realizar os restantes títulos. O título anterior tinha visto o regresso de Lord Voldemort em todo o seu poder e Harry escapara por um triz à morte certa. A história desta 5ª entrega começa então com um Harry perturbado, assolado por pesadelos e deixado ao abandono na casa dos detestáveis tios sem notícias da comunidade mágica. Num profundo estado letárgico pontuado pela ira, Harry vê-se de repente numa situação impossível: um ataque de Dementores em pleno subúrbio de Londres. À beira da expulsão de Hogwarts, é finalmente resgatado para a sede da Ordem da Fénix, uma sociedade secreta de combate às Artes Negras que se volta a erguer para fazer frente ao mais cruel feiticeiro de que há memória, ao mesmo tempo que o Ministério da Magia nega por completo o seu regresso ao poder. Neste ambiente opressivo, o regresso a Hogwarts nunca foi tão mau para Harry: não só descobre que os seus colegas não acreditam nele, supondo-o um menino mimado em busca de atenção, como a nova professora, Dolores Umbridge, enviada do Ministério, implementa um duro regime de controlo na escola. Ansioso por lutar contra o sistema e revelar a verdade, Harry, Ron e Hermione fundam uma rebelião no seio de Hogwarts, ao mesmo tempo que Harry continua a ser atormentado por sonhos cada vez mais realistas.


A Ordem da Fénix marca verdadeiramente o fim da inocência de Harry. O mal deambula livremente pelo mundo, a ira apodera-se dele de tal forma que teme estar a transformar-se noutra pessoa, surgem as paixões românticas, surge a revolta contra o poder estabelecido... e sobretudo sente-se irrevogavelmente só. Só na sua dor, nos seus terrores, na sua confusão, na sua busca por respostas. Com tanto a acontecer, trata-se do mais longo livro da saga, e um dos mais complexos em acção e acontecimentos, logo uma adaptação ao cinema poderia ser tudo menos perfeitamente fiel. É também o livro mais pesado, mais profundamente sob um mau agoiro constante, um certo sentimento claustrofóbico, bem ilustrado logo pelas primeiras cenas: primeiro o parque infantil sob um sol abrasador, espojos de uma infância ressequida, e logo depois uma perseguição de câmera em movimento (muito ao estilo adoptado nas cenas de maior acção d'As Relíquias da Morte Parte 1) por um túnel escuro, encurralados por monstros saídos de um qualquer roupeiro repleto de terrores nocturnos. Mas depois falha noutras alturas. Por exemplo, chegados ao regime ditatorial de Hogwarts, a presença de Umbridge não comprime, não aterroriza. Extremamente bem caracterizada fisicamente por Imelda Staunton, falha na transposição da dualidade da personagem na sua faceta mais perigosa. Em vez disso, os seus decretos inquisitoriais são acompanhados com música alegre, como se tudo não passasse de uma brincadeira, ou estivéssemos perante o vilão do Dennis O Pimentinha. E, no entanto, Michael Goldenberg (argumentista do soberbo “Contacto”, única vez que substituiu Steve Kloves no argumento nos 8 filmes) teve até bastante tacto no que toca a cenas a cortar e adaptações de guião, como por exemplo a relação mais carinhosa que criou entre Harry e Sirius, o passar fluido do tempo nas aulas da Escola de Defesa, e bastantes atalhos (a oclumência com Snape, as detenções, a ausência do Quidditch e do hospital) para chegar mais depressa ao fulcral das questões. Infelizmente, nem sempre foi capaz de acompanhar o ritmo rápido do turbilhão de emoções do protagonista, cujo estado permanente de revolta exigiria uma interpretação muito mais determinada do que aquela que Daniel Radcliffe é capaz, não conseguindo veiculá-la com eficácia e ao mesmo tempo fluidez, resultando assim, a meu ver, na mais sentida descontinuidade emocional da saga. Contudo, há que dizer que há momentos extraordinariamente bem conseguidos, nomeadamente toda a cena final passada no Ministério, desde a Sala das Profecias, em total penumbra com excepção do brilho etéreo de milhões de esferas, passando pela fantástica batalha na sala do Arco, pontuada pela perfeitamente compassada morte de Sirius e de um dos melhores momentos de Radcliffe na expressão da sua dor, culminando no duelo épico entre Voldemort e Dumbledore no átrio principal, intenso, brutal, coroado pelo momento em que Harry, ao ser possuído por Voldemort, percebe finalmente qual a diferença fundamental entre eles os dois – aqui sim, Daniel Radcliffe em todo o seu potencial, com a inspiração que demonstra depois n’As Relíquias da Morte.


Quanto ao elenco, a adicionar à estelar equipa habitual da saga estão Imelda Staunton, numa muito meticulosa construção de Dolores Umbridge, apesar de, no final, não resultar como devia; Ralph Fiennes, tal e qual como na sua breve aparição n’O Cálice de Fogo, é brilhante, não se poderia desejar um Lord Voldemort mais aterrador; brilhante também pode ser apelidada a interpretação de Helena Bonham-Carter na pela da cruel Bellatrix Lestrange. Mas as minhas cinco estrelas vão antes para a Luna Lovegood de Evanna Lynch. O desempenho é perfeito na (in)genuidade e peculiaridade com que olha os outros e o mundo, junto a quem Harry acaba por ganhar algum reconforto. O Dumbledore de Michael Gambon é que é, para mim, um dos maiores problemas deste filme e do anterior porque, falando do ponto de vista do leitor fã, não corresponde minimamente à figura paterna, ao homem tranquilo e sábio, ao derradeiro protector do bem tal como é descrito por J.K. Rowling. Esta representação é agressiva, sonora, por vezes rude, e vacilante onde não devia ser (como no duelo final). E isso fez com que todo um capítulo do livro, um dos mais emocionantes de toda a saga quando Harry descobre finalmente porque é que Voldemort o queria matar ainda em bebé, descobre que tem um destino fatídico, ao mesmo tempo que está imerso na maior mágoa da sua vida e a consumir-se em revolta, dure apenas 2 minutos no filme. Imperdoável.


Harry Potter and the Order of the Phoenix é, sem dúvida, o mais complicado título a trazer para o grande ecrã. No entanto, ao não seguirem o guião à risca e fazendo antes uma interpretação da história, David Yates e a sua equipa conseguiram transmitir o sentimento geral do filme e, apesar de não conseguirem manter a riqueza emocional do livro, ao fim e ao cabo contaram o que havia para contar, num filme tenso, emocionante e um bom prelúdio para os títulos seguintes, que viriam, finalmente, encher as medidas dos leitores acérrimos e dar à saga o final épico que merecia.

Classificação - 3,5 Estrelas em 5

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1 Comentários

  1. Concordo com a cotação e a crítica...
    10 anos depois... a saga termina =)

    vai deixar nostalgia aqueles que gostam da 7ª arte.
    abraços

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