Crítica - Renoir (2012)

Realizado por Gilles Bourdos
Com Michel Bouquet, Christa Théret e Vincent Rottiers.

Depois das inquietações em torno de um desaparecimento (Inquiétudes, 2003) e de uma abordagem ao malogro na vida contemporânea (Afterwards, 2008), Gilles Bourdos debruça-se sobre o clã Renoir, no decurso da primeira guerra mundial. A opção de Bourdos é feliz, relativamente ao tempo em que a acção decorre: devido a um acaso - a convalescença de Jean Renoir, ferido em combate - Pierre-Auguste Renoir, icónico pintor impressionista remetido ao isolamento, convive e coabita, nos seus últimos dias de vida, com os seus filhos. Em oposição às imagens de divulgação e às sinopses já existentes, denunciadoras de mais um polígono afectivo, “Renoir” é muito mais do que um mero relato de um triângulo amoroso...

Baseado na obra escrita de Jacques Renoir, Bourdos (que também divide os créditos da adaptação e do guião com Jérome Tonnerre e Michel Spinosa) retrata aquilo que é uma verdadeira “empresa familiar” de pintura, bem como a sua extinção, aquando da entrada na idade moderna. O retrato de uma gestão doméstica e artística à fim-de-século, auto-centrada num mestre e nos seus caprichos, é único, como o são as clivagens entre os diversos membros do clã Renoir: compaginam-se três gerações antagónicas, em conflito permanente, resultado de um lar espartilhado quer por desvios afectivos, fruto de um passado mais distante, quer em função de uma guerra omnipresente e sanguinária, pela qual o ainda jovem Jean Renoir possui um inexplicável fascínio.
A coincidência da morte de Pierre-Auguste (Michel Bouquet) - génio e ancião eventualmente pernicioso - com a génese do nascimento artístico de Jean (Vincent Rottiers), constitui o fulcro de “Renoir”. E à já de si complexa charneira que a família atravessa, acrescenta-se a contratação de mais uma jovem modelo (Christa Théret), clássica e desejável figura jovem e feminina., cuja dissonante postura provocatória e oportunista - mas também empreendedora e proactiva - questiona um quotidiano embriagado pela beleza da paisagem da Côte D’Azure, mas maculado por tensão e insatisfação permanentes.

“Renoir” é, para além de uma longa-metragem formal, um documento histórico de índole familiar de inegável valor, realizado, fotografado e montado sob códigos impressionistas, nos quais a luz, o bucólico e o tempo se apresentam adequadamente representados, num elogio sóbrio à contemplação e à arte. É, igualmente, uma obra maturada, que ilustra e aborda com coragem o processo criativo e a postura ora arrogante e irónica, ora paternalista e agregadora de Pierre-Auguste Renoir. Nem a produção limitada, mas cuidada, nem um "elenco curto" comprometem "Renoir", destacando-se os bons desempenhos de Michel Bouquet e Christa Théret.
Classificação - 4 Estrelas em 5

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