O Portal Cinema teve o distinto prazer de conversar com EE, presidente da Cinema City, um negócio em expansão em Portugal e que tem conquistado os espectadores com a sua abordagem ao mercado. A conversa centrou-se no projeto Cinema City e no seu desenvolvimento em Portugal, mas acima de tudo esta conversa versou sobre o Cinema e o seu Presente e Futuro, bem como todos os moldes de Cinema que envolvem a Distribuição, Exibição e Produção de Cinema. Uma entrevista interessantíssima que nos faz olhar com um pouco mais de atenção para os bastidores da 7ª Arte e para algo que muitos tomam como garantido mas que envolve imenso trabalho: as salas de cinema.
Portal Cinema - Como prelúdio de qualquer entrevista gosto sempre de pedir aos entrevistados para fazer um pequeno resumo do seu percurso profissional. Sendo oriundo de uma família com história no Mundo do Cinema, quer em Israel, quer em Portugal, pode falar-nos um pouco do que o move a si e à sua família nesta aposta na Exibição de Cinema como negócio? Sempre quis seguir as pisadas familiares e enveredar pelo Mundo do Cinema como empresário?
Eyal Edery (ED): Da mesma forma que o cinema sempre foi a vida do meu pai, também se tornou a minha. Eu nasci no negócio da família e cresci envolvido nesta área.
O Cinema City é o negócio que o meu pai começou e fez crescer. Ele começou a trabalhar num cinema quando tinha 13 ou 14 anos. Apaixonou-se pela área e já não se conseguiu separar dela. Comigo aconteceu o mesmo - desde cedo, nas férias, comecei a trabalhar nos cinemas. Já fiz tudo o que há para fazer, passei por todas as áreas: fiz pipocas, arrumação, projeção, gerência. Montei cadeiras em cinemas novos, nos anos 90, por exemplo, estávamos a construir um cinema em Viseu e as cadeiras de todas as salas foram todas montadas por mim. O cargo que atualmente ocupo e o caminho que segui foi uma evolução natural de todo o meu percurso.
PC - Como descreve a visão do Cinema City para o Mercado Português? O que distingue a oferta Cinema City da concorrência? E como é que o Cinema City se tem adaptado às novas realidades e hábitos do cinema?
ED: Se olharmos para o mercado português, de uma forma geral, podemos dizer que estamos num bom caminho porque continuamos em crescimento. Este ano começou abaixo de 2018 mas, neste momento, já conseguimos igualar o número de espectadores do ano passado. Estamos numa fase em que precisamos de fazer com que o cliente volte a valorizar o produto cinema e volte a colocar a ida às salas na sua agenda como um evento de lazer. Claro que a procura também depende muito da oferta de filmes. De qualquer forma, uma reorganização do mercado e o apoio do governo para corrigir alguns pontos que prejudicaram a área de negócio são ainda necessários.
No geral, o mercado do cinema e a indústria cinematográfica estão a mudar no mundo inteiro, assistimos a fusões e aquisições que tornam alguns estúdios cada vez mais fortes enquanto que para outros é cada vez mais difícil acompanhar a corrida.
Para fazer face aos anos da crise e distinguir as nossas salas da concorrência, apostámos na diversificação da nossa oferta, direcionando os nossos serviços para eventos de grupo, de empresas ou de particulares e continuamos a trabalhar nesse sentido. Desenvolvemos serviços específicos para os nossos clientes, como as festas de aniversário VIP e o próprio City Bar, que é um espaço convidativo para os jovens e complementa a ida ao cinema. Privilegiamos a decoração nas nossas salas e a ambiência, com elementos de filmes que marcaram o nosso imaginário, para que os nossos clientes se sintam parte integrante do filme e que se consigam alienar das suas realidades enquanto assistem a um filme nas nossas salas. Promovemos o conforto e a qualidade.
O Cinema City tenta sempre adaptar-se às novas realidades, mantendo o seu principal objetivo - dar bons filmes às pessoas. Existem públicos que gostam mais de ação, outros de drama, outros de comédia e, por isso, o Cinema City aposta na diversidade. Procuramos não só dar o que a maioria das pessoas gostam de ver, mas também dar outras opções para os clientes nicho, de forma a podermos oferecer a todos os clientes aquilo que realmente procuram e gostam. Podemos afirmar que o Cinema City nasceu para ser um cinema diferenciador.
PC - São várias as pessoas que consideram que o surgimento das Plataformas de Streaming, como a Netflix ou a HBO, têm afetado negativamente o hábito de as pessoas irem às salas de cinema. E, juntamente com a proliferação da pirataria, tais plataformas são apontadas como um dos principais fatores pelo desinteresse do público, principalmente das gerações mais novas, pelas salas de cinema. Partilha dessa opinião? Como é que na sua visão uma empresa como o Cinema City pode aproveitar as Plataformas de Streaming para expandir, inovar e dinamizar o seu negócio atual?
ED: Não vejo essas plataformas como um concorrente direto do cinema. Essas plataformas competem com o tempo de lazer das pessoas, em casa. Neste sentido, considero que essas plataformas são mais um concorrente da televisão, ou da forma de ver televisão, e das outras atividades que se realizam em casa do que propriamente do cinema.
O cinema existe há mais de 100 anos e vai continuar a existir, com as devidas inovações que vão surgindo, porque a experiência de cinema não dá para replicar em casa. Por melhor que o conteúdo dessas plataformas possa ser, somos seres sociais que gostam de sair de casa e relacionar-se e partilhar experiências.
4 - Falando da pirataria, que é de facto uma ameaça à rentabilidade de qualquer negócio que envolve o cinema, desde a produção à exibição. Acha que Portugal poderia fazer mais para travar a batalha contra os downloads e visualizações ilegais de filmes? Qual é a estratégia do Cinema City para convencer o público a ir a uma Sala de Cinema e não optar pelo download ilegal do filme e vê-lo em casa?
ED: A pirataria sempre foi um problema para a indústria cinematográfica e a internet só veio agravar este problema, mas como sabemos a experiência não é igual! É preciso mostrar às pessoas que ver um filme no cinema é muito mais do que assistir a um filme numa televisão, computador ou tablet. Cumpre a mesma função mas a experiência não podia ser mais diferente. Ir ao cinema é uma experiência imersiva - rir ou chorar na companhia de toda uma sala de cinema, confortavelmente sentado, com um bom sistema de som e imagem é elevar a fasquia. Quando conseguirmos fazê-lo, o mercado vai crescer ainda mais e todos vão sair a ganhar em termos de experiência sociocultural.
Além disto, é necessário que o governo crie mecanismos de educação, para mostrar às pessoas que os downloads ilegais representam roubo de uma obra, tal como retirar um objeto de uma loja sem pagar… No imediato, há que criar mecanismos de bloqueio dos sites que promovem estes downloads ilegais.
5 - Neste contexto e, como um dos grandes empresários do Mundo do Cinema em Portugal, gostaria de saber a sua opinião sobre o estado do Cinema em Portugal. Quer de um ponto de vista de exibidor, mas claro também sob uma perspectiva de consumidor e fã de cinema.
ED: Nos últimos anos, temos vindo a assistir a um aumento do número de espetadores nas salas de cinema. O estado da sétima arte em Portugal é de otimismo, mas sabemos que ainda há muito trabalho pela frente. É necessário continuar a criar oportunidades para trazer para às salas novos públicos, aqueles que estão mais afastados e ainda não colocam o cinema nas suas agendas culturais.
Neste momento, vemos que as sagas têm vindo a ocupar um espaço cada vez maior nas salas de cinema: os super-heróis, a animação, os filmes de ação e mais recentemente também os filmes de terror têm lugar nesta premissa. Vamos aguardar para ver qual será a próxima tendência da área de mercado.
O cinema precisa de constante investimento e inovação - não só das salas mas também da própria produção. É preciso criar novas histórias e novas formas de as contar, que continuem a surpreender e a apaixonar as audiências. São as novas histórias que contribuem para esta máquina de sonhos e de dispersão do stress e dos problemas, que é o cinema. O cinema é lazer, mas é também cultura!
PC - Já se falou do presente e, agora, temos que falar do futuro. Qual é a sua perspectiva para o futuro de Exibição de Cinema em Portugal e no Mundo. E como espera/imagina que se verá cinema dentro de alguns anos? Acha que a Inteligência Artificial e a Tecnologia de Hologramas desempenharão um papel central no negócio de exibição cinematográfica?
ED: Em termos de tecnologia, os últimos 15 representaram a maior evolução a que o cinema já existiu: passámos da película para o digital, das lâmpadas de xénon para a projeção a laser, entre tantos outros avanços. Para o futuro, a indústria está a apostar nos ecrãs LED para substituírem as telas convencionais, no som imersivo… são inovações que vão chegando lentamente ao mercado, por serem ainda demasiado caras e, nalguns casos, por falta de conteúdos compatíveis. Acho que a Tecnologia de Hologramas ainda está longe de ser implementada e não consigo ver ainda que tipo de aplicação prática poderá vir a ter para o cinema. Vamos aguardar.
PC - E quanto à produção de cinema. Como exibidor, quais são as suas expectativas e previsões para o futuro da Indústria do Cinema?
ED: Nos últimos anos a aposta tem sido nas sagas e nos filmes de super heróis, mas há uma larga percentagem de público que não se revê neste formato. Acho que é necessário voltar a criar conteúdos para este público que não se revê, criar novas histórias para o trazer de volta às salas e assim diversificar a oferta.
PC - A oferta das salas Cinema City é bastante variada, aliás é de conhecimento público que há algumas salas que passam filmes que há poucos anos nunca teríamos oportunidade de ver numa sala de cinema devido ao seu estilo menos comercial. O Cinema City também se tem aliado a vários Festivais e Festas de Cinema de forma a promover cinema, algo que tem provocado a estreia e, por vezes, exibição única em Portugal nas salas Cinema de muitos filmes culturalmente relevantes. Esta é uma estratégia para continuar? E como a defende perante quem diz que só são as grandes produções de Hollywood que geram dinheiro às salas de cinema?
ED: Sim, esta programação mais alternativa faz parte da nossa estratégia para alcançarmos diferentes públicos e é para continuar, principalmente nas salas de Lisboa, onde os clientes são mais permeáveis a filmes que saiam do circuito mais comercial. Em particular no Cinema City Alvalade, onde conseguimos ter uma programação mais diferenciada, com a exibição de conteúdos europeus e até um pouco mais alternativos. Há muitos filmes de qualidade que, se não for neste circuito dos festivais, das mostras, nunca chegam às salas, por não serem suficientemente comerciais, por não serem dos grandes estúdios, por não terem estratégias de marketing fortes. No geral, queremos ter opções diferenciadoras para todo o tipo de público.
Eyal Edery - Credits Cinema City |
9 - O que podemos esperar do Cinema City para este ano e em anos vindouros em termos de inovação, estratégias e crescimento? As salas Cinema City estão localizadas no Centro e Sul do País, mas há algum plano para levar os Cinemas Cinema City até ao Norte?
ED: O cinema precisa de constante investimento e inovação - não só das salas mas também da própria produção. Estamos sempre à procura da inovação e a pensar em novas estratégias - estamos atentos às novidades que vão sendo introduzidas no mercado, para nos mantermos na vanguarda e para termos um serviço de qualidade que seja valorizado pelos nossos clientes.
Quanto aos planos de expansão, estamos sempre atentos às oportunidades que vão surgindo no mercado mas não pretendemos abrir salas apenas por abrir. Queremos garantir que os projetos se adequam à nossa estratégia de crescimento sustentável.
No que diz respeito às salas, no geral, estamos sempre a fazer remodelações para garantir que a infraestrutura promove uma boa experiência ao cliente. Podemos adiantar que, em particular no Cinema City Alegro Alfragide, acabámos de renovar uma série de espaços comuns, o que contribui para a melhoria global da experiência de cinema.
10 - Como cinéfilo não resisto em terminar esta entrevista com uma pergunta mais pessoal. Quais são os filmes que mais quer ver este ano? Quais são aqueles que lhe despertam mais curiosidade?
ED: Lion King, Joker e Star Wars.
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