Entrevista Com Fernando Vasquez, Diretor de Programação do FEST

Começa já este Domingo o FEST – Novos Realizadores, Novo Cinema acontece este ano entre 2 a 9 de Agosto. Sob o epíteto As close as far away can be, a 16ª edição do festival espinhense continuará a ter na cidade nortenha o seu ponto fulcral de programação, mas alargará o seu raio de acção ao Porto e a Lisboa. Em jeito de antevisão, o Portal Cinema entrevistou Fernando Vasquez, o Diretor de Programação do FEST que nos revelou alguns detalhes desta edição!

Entrevista Com Fernando Vasquez, Diretor de Programação do FEST
Jumbo

Portal Cinema (PC) - O FEST regressa este ano algo desfalcado comparativamente a outros anos, já que devido à Pandemia não poderão realizar-se as já famosas sessões Training Ground que sempre foram um dos pilares e principais orgulhos do festival. O que é que a organização tem planeado para compensar esta ausência de vulto? E poderemos esperar em 2021 uma aposta reforçada no Training Ground como uma “compensação” por esta ausência?

Fernando Vasquez - FEST - Neste período de indefinição causado pela pandemia, a nossa perspectiva foi sempre tentar multiplicar o nosso alcance apesar dos desafios do momento. Já que não seria possível executar algumas das actividades, decidimos criar uma nova sala de cinema, em formato Drive In, na Cidade de Espinho, uma empreitada que por si só representa um enorme salto. Igualmente importante é o facto de expandirmos a nossa actividade na semana do festival ao Porto e a Lisboa, chegando assim a novos públicos, e cumprindo mais eficazmente a nossa missão de promoção de novas vozes da cena nacional e mundial. A programação propriamente dita não diverge significativamente do habitual, diria no entanto que, por exemplo, a nossa competição está mais forte do que nunca.

PC -  Pese embora sem o Training Ground, o FEST vai-se realizar e promete uma programação cinematográfica de elevada qualidade que vai chegar a mais cidades e com potencial para agradar a uma vasta variedade de público. Será possível apresentar em breves palavras esta edição? O que pode o público que não é um espectador assíduo do FEST esperar deste certame?

FEST - O programa desta edição está repleto de algumas das obras mais essenciais dos últimos doze meses. Começando logo pela nossa competição de Longas-metragens, destaco filmes como “Papicha” da cineasta francesa Mounia Meddour, um filme que teve grande impacto em Cannes e foi um dos grandes vencedores dos Césars, os prémios da Academia francesa, onde venceu, entre outros, o premiu revelação. É um filme que nos leva até à Argélia dos anos 90, numa altura em que vários grupos islâmicos ganhavam uma posição de domínio. É neste contexto que um grupo de raparigas vai desafiar as limitações impostas às mulheres. Também de França chega-nos “Jumbo” de Zoe Wittock, uma das mais badaladas obras no último Festival de Sundance. É um filme extremamente arrojado e corajoso, que mistura elementos de realismo social com cinema fantástico, e perfila-se para ser uma dos grandes sucessos do ano. Destaco ainda “Babyteeth” da australiana Shanon Murphy, um dos grandes vencedores do festival de Veneza, e uma comédia negra que se atreve a brincar com o cancro e a forma como uma família lida com a doença da filha adolescente. Por ultimo destaco o “Pacificado” de Paxton Winters, o grande vencedor do último festival de San Sebastian, e que consiste num thriller de Favela, no período crucial pre-jogos olímpicos do Rio de Janeiro.
O formato da curta-metragem continua a dominar o nosso programa, com a nossa competição internacional, e competição académica. Mas o grande destaque aqui tem de ir para o Grande Premio Nacional, que marca os regressos de cineastas como António Sequeira, João Monteiro e Miguel De. Teremos também um foco na Letónia, que é o país em destaque na secção Flavours of the World, com um foco significativo no cineasta Aik Karapetian, o grande timoneiro da nova onde de cinema Letóno.
Por fim, é importante referir que no nosso Drive In teremos duas exibições todas as noites. Começamos sempre com obras de Comedia e depois, à meia-noite, temos sessões de cinema fantástico. 


Entrevista Com Fernando Vasquez, Diretor de Programação do FEST
Babyteeth


PC - Este ano o FEST não passará só por Espinho, já que chegará também ao Porto e a Lisboa, duas cidades bem habituadas a receber festivais de cinema. Quais são as expectativas para estas “extensões”? E o que levou a organização a apostar nesta extensão este ano?

FEST - Sempre foi um objectivo expandir o FEST, na semana do evento, a outras cidades, e o momento tornou-o imperativo. Desta forma podemos chegar a mais gente e contribuir para uma mais eficaz promoção dos filmes. As expectativas é que os amantes do cinema no Porto e em Lisboa respondam à nossa chamada e venham conhecer algum do melhor cinema que se fez nos últimos meses, e perceber um pouco melhor o nosso evento.

PC - Já se sabe que a pandemia Covid-19 teve um impacto significativo na organização do FEST, até devido á ausência já abordada. Mas quais foram, na vossa opinião, os principais desafios de organizar um festival desta dimensão neste período conturbado? 

FEST - Em primeiro lugar, a preocupação central foi encontrar formas de manter a nossa estrutura e garantir a segurança da nossa equipa. A quarentena chegou num período critico no nosso processo de programação, e tornou difícil a negociação de filmes, até porque a indústria ficou amplamente desregulada e desnorteada com o momento. Assim que ficou tudo mais esclarecido, o maior desafio foi mesmo criar as condições necessárias para garantir que o evento pudesse ter lugar em formato físico, como sempre o quisemos. Foram todos desafios gigantes, mas estamos muito contentes com a forma como respondemos a todos os obstáculos.


Entrevista Com Fernando Vasquez, Diretor de Programação do FEST
Papicha



PC - Quais são os grandes temas que podemos esperar desta Programação e que linha editorial motivou a escolha de todos os filmes em exibição?

FEST - Como já tem vindo a acontecer nos últimos anos, o nosso programa tem uma quantidade significativa de mulheres realizadoras. Só na nossa competição de Longas-Metragens, das 10 obras seleccionadas, 7 são de mulheres realizadoras. Isso reflecte-se até certo ponto a nível temático. Por exemplo, temos uma serie de obras que abordam a questão da maternidade, de forma directa e indirecta. O mais óbvio é o “Maternal” da cineasta argentina Maura Delpero, que nos traz um filme sobre uma casa de acolhimento de mães adolescentes liderada por freiras, apresentando-nos de forma sublime diferentes experiências e visões de se ser mãe. O momento que atravessamos também emerge de forma indirecta, e em formatos curiosos. Na nossa competição de curtas, destaco o filme grego “Postcards from the end of the world” de Konstantinos Antonopoulos, que nos apresenta a uma família que vê as suas férias interrompidas pelo apocalipse. Mas talvez o formato mais dominante, e esse sim é uma novidade para nós, é o formato da comédia negra. Nunca tivemos tantas comédias em exibição, mas este ano surgiram uma data de obras invulgarmente de relevo dentro do estilo. Para além de algumas já mencionadas, destaco os nossos filmes de abertura e encerramento. Para a abertura temos o “Patrick” do belga Tim Mielants, que consiste num thriller policial passado num parque de campismo para nudistas, e onde um homem enfrenta uma crise existencial enquanto procura pelo seu martelo desaparecido. O filme é provocadoramente hilariante. Para o encerramento temos a mais recente obra da finlandesa Jenni Toivoniemi, um regresso ao nosso evento, com o filme “Games People Play”, que retrata um encontro entre amigos trintões numa casa de campo, que rapidamente se transforma num exposição de várias crises de meia-idade algo precoces.

PC - Este ano pode não existir Training Ground, mas haverá o Pitching Forum, outro pilar do FEST. O que levou a organização a manter esta parte importante do festival e como foi desenvolvido o novo modelo? Quais são as expectativas para a sessão final de pitching? 

FEST - Uma das prioridades este ano foi garantir que tudo o que fizéssemos pudesse se transformar numa mais-valia para as actividades. Fazer o Pitching Fórum em formato online permite-nos confirmar a participação de mais produtores e investidores internacionais, o que por si só é uma enorme vantagem. Como um dos grandes objectivos do evento é preparar os participantes na arte de fazer um bom pitch de projectos, o contacto humano joga sempre um papel vital. À distância é sempre mais complicado, mas ao mesmo tempo mais desafiante. Foi preciso repensar um pouco a forma como era feito o treino, e todas as técnicas de pitching tiveram de ser reformuladas. Na realidade, apesar das dificuldades, os participantes sairão desta experiência mais preparados para o futuro, por isso, até nessa perspectiva, a iniciativa reveste-se de novo relevo.

PC – O que podemos esperar de futuras edições do FEST? E que mensagem final querem deixar aos possíveis espectadores do festival?

FEST - É difícil especular sobre o futuro nesta fase. Está tudo em aberto. O que podemos garantir é que continuaremos a trabalhar como sempre trabalhamos, sempre focados nos nossos objectivos e em continuar a transformar o evento numa referência internacional, e num poiso obrigatório para todos os amantes do cinema e aqueles que querem conhecer melhor os meandros da indústria cinematográfica.
Estes tempos de distanciamento social estão a ser particularmente complicados para muita gente, e eu acredito que existe uma grande ânsia por experiências de grupo. Ir a uma sala de cinema e partilhar todas as emoções e sentimentos de forma colectiva é mais importante do que nunca. Da nossa parte fizemos tudo o possível para permitir que todos os interessados em cinema possam participar. A chamada está feita. Resta agora à audiência dar o próximo passo. Tudo o que podemos garantir é que valerá a pena.

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