A trágica história do pequeno Gregory Villemin é, ainda hoje, conhecida e comentada em toda a França graças a uma macabra saga criminal (ainda hoje sem resolução) que teve todos os elementos de um grande thriller de Hollywood (aliás até um grande clássico do cinema francês marcou presença no caso). Foi no Outono de 1984 numa pequena vila alinhada nas Montanhas Vosges no noroeste de França que Gregory foi assassinado. O menino foi raptado à porta da sua casa enquanto brincava e, nesse mesmo dia, o seu corpo sem vida foi encontrado no rio Vologne. Os seus pés e mãos tinham sido atados e Gregory tinha sido atirado ainda vivo ao rio, onde acabou por morrer afogado.
O crime chocou a França e rapidamente transformou a pequena vila de Docelles num circo mediático. Quem poderia ter morto o pequeno Gregory numa cidade tão pacata e onde todos se conheciam? A grande avalanche mediática que envolveu o caso surgiu logo após a descoberta do corpo, mas ganhou uma dimensão completamente bizarra com as revelações de eventos que antecederam a morte de Gregory. Isto porque a sua família não acreditava que a criança tinha sido vítima de um ataque aleatório perpretado por um pedófilo ou por um serial-killer, mas sim que este tinha sido cometido pelo O Corvo. E quem é O Corvo?
É aqui que o caso ganha contornos de filme de Hitchcock. Durante os anos que antecederam a morte de Gregory, boa parte dos elementos da sua família receberam cartas e telefonemas ameaçadores de uma pessoa não identificada que promoveu um verdadeiro clima de terror graças às suas arrepiantes mensagens e às suas desconcertantes ameaças, uma das quais visou inclusivamente o pequeno Gregory uns dois anos antes da sua morte, algo que levou os seus pais a tomarem medidas adicionais de proteção. Movido pela inveja do sucesso e do amor que unia os pais de Gregory, o Corvo parecia determinado a afastar a família e a arruinar os laços afectivos com as suas ações e, a julgar pelos vários relatos da própria família, estava a conseguir esse objetivo. Certo dia, o Corvo parou de importunar a família e durante algum tempo não deu sinais de vida, isto é até ao dia do trágico homicídio de Gregory. No dia a seguir ao seu corpo ter sido descoberto, os seus pais receberam uma carta assinada pelo Corvo onde este confessava o crime. Já no dia anterior esta figura sombria tinha ligado a um dos familiares da criança a anunciar o que tinha feito e a indicar onde poderiam encontrar o seu corpo.
Quem é o Corvo? Mais de trinta anos depois, esta pergunta permanece sem resposta. O nome O Corvo (ou Le Corbeau em francês) advém do clássico "Le Corbeau" de 1943 realizado por Henri-Georges Cluzot, onde uma cidade é aterrorizada por uma série de cartas enviadas por uma figura desconhecida, apelidada de Corvo, que intimidava vários habitantes e que era movida por sentimentos de inveja e grande rancor. No filme, o Corvo não chega a fazer vítimas, mas na vida real esta figura foi mais longe e acabou por matar uma criança inocente.
Durante anos, o caso monopolizou a atenção mediática de França e, mesmo na Europa, foi alvo de extensa cobertura por parte da imprensa. Este estranho caso é abordado de forma muito competente pela minissérie documental "Gregory" (Disponível na Netflix) que, por via de testemunhos com a família e intervenientes no caso, tenta explicar todos os seus contornos. Ao contrário de outras minisséries semelhantes, "Gregory" não tem uma vertente muito focada na parte da investigação. A preocupação aqui é explorar todos os eventos do caso (e são bastante e diversos) e, no final, mostrar o porquê deste caso ainda hoje ser alvo de tanta atenção mediática por parte da imprensa francesa. O facto de nunca se ter descoberto quem é o Corvo e quem matou Gregory é, claro, um dos apelos mediáticos, mas todas as tramas políticas, familiares e criminais que nasceram por causa deste caso também suscitam grande curiosidade. Como disse, o caso Gregory supera qualquer obra de ficção na panóplia de eventos, mistérios e crimes que envolveu. É um caso único que, caso não conheça, tem de descobrir....e a minissérie "Gregory" é provavelmente a melhor forma de o fazer.
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