Crítica - Dawn of The Planet of The Apes (2014)

Realizado por Matt Reeves 
Com Gary Oldman, Keri Russell, Andy Serkis, Kodi Smit-McPhee

A 20th Century Fox bem pode estar orgulhosa da sua aposta no reboot da saga “Planet of The Apes”, porque até agora tem sido uma aposta de grande sucesso. A primeira entrega desta jogada arriscada surgiu em 2011 e surpreendeu todos aqueles que duvidavam do seu potencial ao apresentar um conjunto de méritos de qualidade, como um guião bem conseguido ou uma componente técnica irrepreensível, que em conjunto conseguiram cativar e divertir o público e os especialistas em todo o planeta. Os que apreciaram a primeira entrega deverão agora ficar igualmente rendidos à sua sequela, porque “Dawn of the Planet of The Apes” manteve, sem surpresas, o elevado nível apresentado pelo seu antecessor e ainda conseguiu introduzir uma energética e competente dinâmica bélica que promete escalar numa terceira entrega que, apesar de ainda não ter sido oficializada, deverá fazer parte dos planos futuros da 20th Century Fox.
A trama deste segundo capítulo do reboot de “Planet of The Apes” decorre dez anos após os eventos de “Rise of the Planet of The Apes”. Neste espaço temporal, a Terra perdeu grande parte da população humana por causa da altamente contagiante Gripe Símia, que só não matou toda a espécie humana porque existem indivíduos que são geneticamente imunes aos efeitos trágicos do vírus. Um grupo desses humanos juntaram-se nas ruínas de São Francisco e formaram uma pequena comunidade de sobreviventes, cujos líderes tentam arranjar, no meio do caos, uma forma de reconstruirem a sociedade. O problema é que os recursos energéticos que têm à sua disposição estão-se a esgotar rapidamente e, para evitarem um novo colapso, os sobreviventes terão que reativar uma velha barragem que fica no meio do território ocupado por uma nação crescente de macacos geneticamente evoluídos que aproveitaram a queda da Humanidade para construírem a tão desejada sociedade idealizada por Caesar, o seu grande líder destemido. Os objetivos dos sobreviventes humanos entram por isso em conflito com os desejos de liberdade dos macacos, mas quando estas duas raças reaproximam-se outros perigos aparecem e dão origem a um grande conflito que irá definir se ainda há esperança para a coexistência pacífica entre ambas.


A história de “Dawn of the Planet of the Apes” continua a desenvolver com muita habilidade e emotividade os avanços e recuos da conturbada relação de coexistência entre macacos e humanos. Esta relação já deu pano para mangas em “Rise of The Planet of The Apes”, que explorou as origens do lado bom e do lado mau desta relação singular. No espectro do lado positivo, o primeiro filme aproveitou da melhor maneira possível a relação de irmandade entre o macaco Caesar e o humano Will para estabelecer uma proximidade sentimental entre ambas espécies que molda, como se viu e confirma neste filme, o carácter bondoso de Ceasar. Esta ligação é recuperada nesta segunda entrega por intermédio das recordações de Caesar, mas também por uma relação próxima de genuína amizade e respeito que se desenvolve entre Caesar e Malcom e que reforça, uma vez mais, as contiguidades emocionais e mentais entre ambas espécies e confere, por isso, um sentimento de esperança a um desfecho positivo de convivência entre ambas, sentimento esse que é reforçado pelos laços de coexistência que se formam também entre outros homens e macacos, como acontece por exemplo com o filho de Malcom e o sábio macaco Maurice. Tal como no primeiro filme, estas ligações positivas aproximam o espectador de uma intriga mais moral e dramática que vai mais além do especto bélico e conflituoso da saga, algo que lhe confere por isso uma dimensão mais humana e filosófica, já que é sempre um deleite acompanhar as aproximações e pontos de viragem que marcam a estreita relação de amor/ ódio que pauta a para já complexa relação entre duas espécies que são extremamente parecidas. É esta parecença de mentalidades que exalta também o lado negativo da sua coexistência. Estas parecenças já tinham sido timidamente exploradas no primeiro filme por intermédio dos sentimentos de ódio, vingança e violência que vários macacos nutrem contra os humanos por estes os terem maltratado, mas graças à influência positiva de Caesar, esses perigosos sentimentos foram postos de lado em detrimento do desejo de liberdade do grupo símio e, apesar de no final de “Rise of The Planet of The Apes” haver uma pequena sequência de tensão entre humanos e macacos, o grande conflito nunca escala e cada espécie segue caminhos diferentes. Nesta segunda entrega o mesmo já não sucede, porque desta vez assistimos a uma escalação do ódio que vários membros rebeldes das duas espécies sentem uns pelos outros. É porque desta vez os humanos também têm múltiplas razões para odiarem os macacos, já que muitos culpam os símios pelo apocalipse que devastou a Terra e, após descobrirem que os macacos são uma grande ameaça ao seu domínio, ficam também com um compreensível receio do que eles podem fazer, algo que, como é óbvio, atrai também perigosos sentimentos de destruição e revolta que se tornam explícitos nas atitudes de ódio e desconfiança protagonizadas por várias personagens, como Dreyfus, um dos líderes militares dos sobreviventes humanos. Os macacos, por sua vez, apesar de já viverem em paz, não esquecem também o medo e o ressentimento que nutrem em relação aos humanos, sendo que a grande figura do ódio dos macacos aparece retratada em Koba, um dos principais aliados de Caesar, que no decurso do filme começa a destacar-se como o grande vilão desta entrega com as suas atitudes impensadas e carregadas de ódio, que exemplificam bem as parecenças de mentalidade entre os humanos e macacos, duas espécies que podem compartilhar muita bondade, mas que também compartilham maldade. 
Esta explosão de sentimentos de ódio e fúria dão origem a várias ações violentas que apagam tudo de bom que poderia ter sido construído com base na relação de amizade e confiança que se estabelece entre Ceasar e Malcom, sendo por isso o precursor do real início do conflito entre as duas espécies que será explorado, previsivelmente, com mais pormenor bélico na terceira entrega. Nesta segunda produção somos portanto confrontados com o esperado escalar das tensões entre as duas raças que, após alguns planos macabros e hediondos perpetrados por ambas as partes, culminam num grande ataque dos macacos contra os humanos que dá início, como Caeser mais tarde admite, a um conflito irreversível entre as duas. É claro que graças à demonstração de vários comportamentos de compaixão de ambas as partes, a figura da coexistência pacífica entre ambas não é posta de lado para o futuro e, por isso, não se torna completamente inevitável a extinção de uma espécie, mas o certo é que por muito espaço que possa haver para diálogo e compreensão entre ambas, o que se avizinha no futuro próximo é mesmo um conflito provocado por ações irrefletidas e movidas por ódio de apenas uma pequena fração dos envolvidos, nomeadamente pelo vilão Koba que é, sem dúvida, a personagem mais detestável de toda a saga até ao momento, algo que diz muito da sua competente construção maléfica. A intriga de “Dawn of The Planet of The Apes” prepara, desta forma, com grande contexto e emoção o gigante conflito que se avizinha, mas também prepara as bases para um possível entendimento pacífico entre as raças, já que mostra que há humanos e macacos interessados na paz. 
A parte final de “Dawn of the Planet of The Apes” está portanto carregada com sequências de conflito e ação que dão mais vida e violência a uma segunda entrega mais focada para a ação que a primeira. Este enfoque é natural atendendo às consequências do desenrolar natural da narrativa e aparece, portanto, muito bem contextualizado e perfeitamente enquadrado com tudo o que foi explorado no passado, preparando também adequadamente o que virá no futuro. O retrato que é feito do primeiro grande conflito entre macacos e humanos está bem conseguido, tal como o grande confronto final entre Ceasar e Koba que ilustra, irrepreensivelmente, a violência natural e territorial dos macacos. Estas duas sequências são as principais doses de ação do filme, mas há outras mais tímidas espalhadas por todo o filme que ajudam a apimentar a trama e polvilhar os avanços e recuos da relação entre humanos e símios com uma série de importantes desafios à boa vontade e sensibilidade de ambas as espécies. No final, “Dawn of The Planet of The Apes” acaba como “Rise of The Planet of The Apes”, ou seja, tem um final aberto mas que deixa antever um futuro catastrófico e cheio de incerteza para o planeta Terra e para as duas raças que, agora, lutam pelo seu domínio. 


O que falha neste projeto são alguns pormenores, como o crescimento da pobre relação romântica que o filme tenta desenvolver entre Malcom e a enfermeira Ellie, ou a aproximação maternal de Ellie junto do filho de Malcom. Estes dois aspetos da trama são mal explorados porque não são alvo de desenvolvimentos minimamente explícitos ou até de tentativas sérias de conquistar o interesse do espectador, já que ambas passam muito ao lado do público em detrimento de outros assuntos mais empolgantes. O que é certo é que estes pormenores não acrescentam nada ao argumento e, a dada altura, os seus criadores parecem ter-se apercebido de tal facto porque, após uma grande insistência inicial nestas componentes, param de existir referências objectivas. Os problemas familiares de Caesar junto do seu jovem filho rebelde também não são explorados com grande atenção, mas pelo menos esta componente familiar tem algum sentido e impacto no desenrolar filme, apesar de ser notório que poderia ter tido uma maior importância se tivesse seguido um caminho diferente, no entanto, apresenta conclusões interessantes que tornam a traição de Koba ainda mais chocante. O que fica um pouco aquém também são as interpretações do elenco humano, onde estrelas como Jason Clarke, Gary Oldman e Keri Russell exibem-se muito abaixo dos parâmetros do filme. O mesmo já não sucede com Andy Serkis  e Toby Kebbell , que assumem na perfeição os papéis computorizados de Caesar e Koba, respetivamente.
O que não falha aqui são os aspectos técnicos. Tal como “Rise of The Planet of the Apes”, “Dawn of The Plane of The Apes” apresenta uma sublime componente técnica a todos os níveis, menos na banda sonora que, para ser sincero, não me cativou. O que realmente salta à vista são os seus magníficos efeitos especiais computorizados que conferem uma vida e realismo impressionantes aos macacos, que são quase tão realistas e credíveis como os próprios humanos que aparecem em cena. Os seus cenários apocalípticos também estão muito bem conseguidos, havendo também muito mérito da fotografia de Michael Seresin. É por tudo isto que “Dawn of The Planet of The Apes” não foge nada ao nível do seu elogiado antecessor, porque também se evidencia como um bom projeto comercial com um bom argumento e com um empolgante fundo moral e intelectual. A juntar a isto tudo, esta segunda entrega beneficia ainda de boas sequências de ação e, claro está, de otimos gráficos e efeitos especiais que tornam ainda mais empolgante a experiência do espectador.  

Classificação – 3,5 Estrelas em  5

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